Brasil: pátria educadora?

César Silva*

Para começar a refletir sobre o tema educação, é preciso relembrar o trecho do discurso de posse da presidente reeleita Dilma Rousseff, em 1º de janeiro, em rede nacional: “ Brasil – pátria educadora”… O que esta frase tão expressiva efetivamente significa? Pode ser apenas uma estratégia de desvio de foco das outras áreas para a educação, ou um real desejo de fazer do seu último mandato uma marca no setor que mais influencia as mudanças socioeconômicas, o que me parece ser a melhor alternativa.

Desde o momento inicial da nova gestão do Governo Federal, é a educação um dos grandes temas. O PNE (Plano Nacional de Educação) traz metas e propostas integradas entre níveis e mostra o compromisso, até 2020, de crescimento para o acesso ao ensino baseado no acompanhamento da qualidade.

Hoje, existe uma estrutura de monitoramento, que mantém instrumentos como as avaliações Enem, Enade e outras provas de abrangência nacional. Além dos indicadores de qualidade associados aos seus resultados, tais exames garantem o direito ao acesso a benefícios vinculados a políticas públicas.  Destaca-se, ainda, a disponibilidade de vagas nas instituições públicas pelo Sisu (Sistema de Seleção Unificada), bolsas em instituições privadas como o Prouni (Programa Universidade para Todos), Bolsa Formação do Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego) e financiamento do curso de graduação a juros bem atrativos como no Fies (Fundo de Financiamento Estudantil).

Mas, mudanças ocorreram ao final de dezembro de 2014, quando o Governo Federal, através do Ministério da Educação, publicou a Portaria nº 21, que, entre outras decisões, restringiu o acesso ao Fies. O documento prevê que somente concluintes de ensino médio, que tenham se submetido ao Enem e que tenham obtido no, mínimo, 450 pontos em mil possíveis, e que não tenham zerado na redação, poderão se valer deste fundo. A decisão parece adequada, pois, além da carência social comprovada, torna-se necessário apresentar um mínimo de qualidade acadêmica indicada.

Esta pequena mudança na regra de acesso ao Fies trouxe para o segmento uma grande turbulência. No mercado, grandes grupos educacionais como Kroton, Estácio, Ser Educacional e Anima tiveram suas ações desvalorizadas entre 10% e 15% imediatamente após a publicação desta portaria.

A justificativa deste efeito é que estes grandes grupos têm muitos alunos matriculados que não participaram da prova do Enem quando do seu ingresso, mas utilizam financiamento público. Desta forma, para os próximos vestibulares existe uma expectativa de redução de matriculas em até 30%, implicando em menor receita. No entanto, como a limitação definida quanto ao conceito obtido no Enem para dar direito ao acesso ao Fies somente será aplicada a partir de abril de 2015, a análise mais criteriosa leva à crença de que as possíveis perdas de receita serão menores.

A mesma portaria, a nº 21, traz uma nova forma de repasse dos valores dos alunos matriculados pelo Fies. Na verdade, o número de parcelas anuais foi reduzido de 12 mensalidades para oito a cada 45 dias. Efetivamente, o fluxo de caixa das instituições que oferece o Fies pouco será afetado, pois a primeira parcela das 12 (operação anterior a Portaria nº 21) nunca foi paga em menos de 45 dias.

A determinação de limitação ao Fies leva à necessidade mais aplicações do Enem, por ano. Devido à imensidão que o Enem tem hoje, no Brasil, existem muitos desafios para a organização de mais períodos de aplicação das provas que precisam ser superados rapidamente para a evolução do sistema. Será preciso, por exemplo, certificar e equipar uma rede de instituições confiáveis para que as provas possam ser aplicadas em uma plataforma digital, com validação biométrica e gravação do período de aplicação. Além disso, o governo deverá selecionar uma plataforma digital que comporte questões por graus de dificuldades e diferencie cada prova aplicada, elaborando um banco de questões baseadas na teoria da resposta ao item.

Este modelo tem semelhanças com o SAT, uma espécie de Enem dos Estados Unidos, aplicado com sucesso desde a década de 1970 e que pode ser usado como um exemplo para acelerar a implantação desta nova modalidade no Brasil. A experiência da Fundação FAT na elaboração de vestibulares, em parceria com Centro Paula Souza desde 1989, mostra que o ideal é a utilização de um sistema digital de elaboração/seleção de provas. Para isso, são desenvolvidas centenas de milhares de questões, que ficam disponíveis em banco para cursos técnicos e superiores.

A grandiosidade dos números da educação no Brasil, apresentados até 2014 e previstos a partir de 2015, em todos os seus níveis, exige muita atenção, planejamento e organização para que nenhuma decisão inesperada possa afetar, de maneira inadequada e irrecuperável, a evolução do setor. Assim, terminado o ano de 2014, iniciamos o ano de 2015 com muitas perspectivas e expectativas.

A visibilidade do setor, que acabou trazendo grupos de investimentos nos últimos cinco anos, movimenta, por ano, centenas de milhões de reais, conta com dezenas de milhões de alunos por nível educacional e centenas de milhares de profissionais diretos. Assim, poucas linhas de regulação refletem em grandes impactos. Planejamento, gestão e articulação são as palavras principais para que a educação no Brasil mantenha suas perspectivas de crescimento, evolução e aprimoramento.

*César Silva é presidente da Fundação FAT (Fundação de Apoio à Tecnologia) e atua como professor da educação profissional há mais de 20 anos.

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