A política cantagalense no início do século XX

Estimulado pelo artigo sobre a criação do 3º Distrito Eleitoral em Cantagalo, volto à cena para falar da política no município após o benefício.

Sabe-se que, na época, a política estadual girava em torno de duas fortes agremiações: o Partido Republicano Fluminense (PRF) e o Partido Republicano do Estado do Rio de Janeiro (PRRJ). O primeiro, fundado por Thomaz da Porciúncula e seus sequazes, logo após à queda de Francisco Portella, era composto de republicanos históricos e monarquistas insatisfeitos com o rumo dos acontecimentos, objetivando um partido republicano, é claro, mas conservador, moldado nos padrões imperiais. E o segundo, fundado anos após, por Nilo Peçanha e alguns simpatizantes do governo deposto (inclusive o famoso sociólogo Alberto Torres, que, em 1897, derrotou o cantagalense João Baptista Laper, em célebre pleito governamental), pugnava pela vitória das ideias liberais.

Em Cantagalo, que à semelhança de outros municípios seguia de perto a política estadual, esses partidos prosperaram, mas em forma de frentes partidárias locais, que tomaram próprios em função dos respectivos chefes. O PRF, por exemplo (do qual a terra de Euclydes da Cunha tornou-se vanguardeira no estado), era conhecida como “Miquelista” em homenagem a Miguel de Carvalho, ou então “Julista”, porque depois foi dirigido por Júlio Santos. Ou – o que era mais comum – facção dos “Jagunços”, sem que se saiba o motivo do apelido. O PRRJ, por sua vez, capitaneado por Honório Pacheco e César Freijanes, era chamado de facção “Honorista” ou “Caburé”. Havendo, ainda, uma terceira frente, denominada de “Cagassebos”, que também era importante, porém não filiada a nenhum dos dois grandes partidos estaduais, variando de posicionamento em função da troca deles no poder. Essa terceira força, que agia mais como fiel de balança do que agente direto na disputa, era atuante no distrito de Cordeiro, onde tinha por chefes os jornalistas Senna Campos e Francisco Lessa.

Cada uma dessas frentes tinha apoio de um dos jornais do município, a saber: a dos “Jagunços” era apoiada pelo “Correio de Cantagalo”; a dos “Caburés”, pela “Tribuna de Cantagalo”; e a dos Cagassebos” pela “Gazeta de Cordeiro”. Isso, sem falar nas bandas musicais que, antes da respectiva fusão, em novembro de 1914, havia na cidade: a “Sete de Setembro”, simpática aos “Caburés”, e a “Flor de Maio”, adepta dos “Jagunços”.

Na terra cantagalense, como de resto nos demais municípios, os partidos políticos não eram conduzidos por diretórios escolhidos pelos simpatizantes, mas por chefes vitalícios e poderosos, com grande ascendência econômica e social sobre a comunidade, denominados “Coronéis”. Eles não eram grandes fazendeiros ou latifundiários, como geralmente se apregoa, mas cidadãos urbanos ou rurais que se dedicavam à política e gozavam de muito prestígio junto as cúpulas partidárias na capital. Serviços sociais como internações hospitalares, obtenção de empregos, segurança e até fornecimento de dinheiro, que, hoje, são fornecidos pelo governo ou instituições previdenciárias, eram prestados por eles; razão pela qual eram benquistos e muito prestigiados pelos correligionários.

Alguns desses “Coronéis” ficaram até célebres na comunidade, como Honório Pacheco, César Freijanes, Bibi de Mello, Zinho de Freitas, Júlio Santos e outros, que tinham esse perfil e detiveram, por largo tempo, o controle político do município.

O fato de ser o voto ainda a descoberto e não secreto, além de prestado em listas completas e não em cédulas individuais, facilitava esse controle. Inclusive, ensejando aos interessados, mesmo antes da apuração, saber o número de votos obtidos em cada urna.

*Clélio Erthal é advogado, ex-procurador da República, ex-juiz federal e pesquisador da história de Cantagalo e região.

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