Hirann Montechiari Figueira é contador público a mais de 25 anos, trabalhando com Prefeituras do interior do Estado e de menores arrecadações.
Segundo ele, “em 90% dos municípios do Brasil as principais receitas são provenientes de transferências dos Governo Federal e Estadual. Dentre essas receitas estão o ICMS e o FPM que são resultantes da atividade econômica“.
“Se as indústrias, o comércio, as prestadoras de serviços pararem suas atividades, a primeira ação resultante será a queda abrupta na arrecadação de impostos. Se 90% dos municípios dependem economicamente desses recursos para manter as atividades essenciais como educação, assistência social e saúde, como essa engrenagem funcionará?“, questiona o contador, no artigo publicado com exclusividade pelo JORNAL DA REGIÃO, logo a seguir.
A ARRECADAÇÃO MUNICIPAL E A DEPENDÊNCIA DOS REPASSES DOS GOVERNOS FEDERAL E ESTADUAL
Quando se fala em impostos, esse assunto amedronta quase que a maioria dos cidadãos brasileiros. O Brasil possui uma altíssima carga tributária, sendo uma das maiores do mundo e isso não é novidade pra ninguém.
A arrecadação de receitas pelos municípios do interior fluminense é profundamente dependente dos repasses de recursos como o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços) transferido pelo Governo do Estado, assim como do FPM (Fundo de Participação dos Municípios) transferido pelo Governo Federal. Sabe-se que a arrecadação dessas receitas está diretamente envolvida com atividades de comércio e prestação de serviços e em industrialização de produtos. O FPM – Fundo de Participação dos Municípios é uma transferência constitucional (CF, Art. 159, I, b), da União para os Estados e o Distrito Federal e aos Municípios, fruto da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
Desta forma, os Governos Federal e Estadual arrecadam os recursos anteriormente citados e, de acordo com determinações legais, repassam parte desses recursos aos municípios conforme alíquotas pré-definidas a cada caso.
Uma pandemia como a do Coronavirus chinês (Covid-19) que enfrentamos nos dias atuais, aonde, por determinações específicas em Decretos os Governos decretam o fechamento de empresas, fábricas e comércios, a atividade econômica tende a reduzir drasticamente. Essa redução de atividade resultará na redução das receitas das empresas e, consequentemente, a impactará a arrecadação de impostos negativamente.
Ora, os pequenos municípios brasileiros, mais especificamente os do interior fluminense, conforme citado anteriormente, dependem substancialmente dessas receitas serão os mais impactados. Vejamos os exemplos a seguir.
O município de Cantagalo teve uma receita total arrecadada no exercício de 2019 no montante de R$ 101.388.889,30. A arrecadação tributária, aquela diretamente arrecadada através de ações próprias do município, e que envolvem o IPTU, ISS e taxas diversas resultaram numa arrecadação de R$ 7.735.485,60. Os recursos diretamente arrecadados são 7.63% do total de suas receitas. O total de recursos recebidos por transferências correntes da União e do Estado dentre outras resultaram em R$ 78.510.901,60 o que representa 77,43% do total arrecadado.
Outros municípios da região como Cordeiro, Macuco, Bom Jardim, São Sebastião do Alto, Trajano de Morais e Duas Barras também seguem a mesma regra de Cantagalo. Para tanto, vejamos o gráfico abaixo que apresenta os números de cada um:
Como se pode observar, os municípios citados necessitam quase que integralmente dos repasses federal e Estadual. Nesse interim nem mencionamos as receitas clamadas “de capital” que são aquelas utilizadas integralmente para os investimentos, assim como receitas dos Fundos Previdenciários, que se destinam ao plano de aposentadoria dos servidores.
Com a Covid-19 ou Coronavirus chinês, e o consequente isolamento social na forma recomendada pela OMS como forma mais eficaz de combate à doença, pode provocar a queda de até 39,3% na arrecadação de impostos no Brasil. Esse número é resultado de um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), que considera as receitas tributárias da União, Estados e municípios do País (https://ibpt.com.br/noticia/2833/Queda-da-arrecadacao-tributaria-em-decorrencia-dos-efeitos-da-pandemia-do-Coronavirus).
Numa regra básica comparativa, mesmo que simplória inicialmente, se esse resultado realmente se concretizar, imagine o que ocorrerá nos municípios que mencionamos anteriormente? Em Municípios que dependem 70, 80 e alguns em até 90 por cento dos repasses de recursos, se esses recursos tiveram uma retração dos mencionados 39% apurados no estudo do IBPT no pior cenário imaginado, que seria o confinamento mantido até julho de 2020, o que acontecerá com as receitas dos mesmos? Essa resposta é óbvia!
Sem querermos ser catastróficos, a realidade nos conduz para uma situação totalmente aterradora. Se utilizarmos como exemplo o município de Macuco, que é o maior dependente de repasses conforme citamos no gráfico anterior, a receita terá uma estimativa de redução de quase 17 milhões de reais no ano. E como ficará o pagamento de serviços essenciais de Saúde, Educação e Assistência Social? Como ficará o Prefeito para honrar com o pagamento dos seus funcionários? A resposta para essa pergunta nós não temos. O que podemos fazer é torcer para que essa pandemia acabe o mais rápido possível, para que voltemos às nossas atividades, mas sabemos que o retorno aos números de janeiro de 2020 demandará um esforço conjunto de toda a sociedade, e que será demorado.
As informações apresentadas neste foram obtidas através do site do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (www.tce.rj.gov.br), pelo fato de que muitos municípios não disporem as informações estabelecidas na Lei de Responsabilidade Fiscal – LC 101/200. Os sites de transparência de alguns municípios sequer abrem as páginas corretamente, e em alguns casos não apresentam quaisquer informações, demonstrando um desrespeito à Lei, bem como ao contribuinte que tem o direito de saber o que se passa na administração do seu município.