‘Tenha orgulho sempre do município de Cantagalo, onde nasceu Euclydes da Cunha’

Evaldo Vicente é empresário paulista, jornalista e estudioso do escritor cantagalense

Evaldo Vicente, é jornalista, empresário, dono de gráfica e três jornais no interior de São Paulo: o diário A Tribuna Piracicabana e os semanários Tribuna de Rio das Pedras e Tribuna de São Pedro. Ele foi presidente da Associação dos Diretores de Jornais do Interior do Estado de São Paulo (Adjori-SP) no período de 1993 a 1996. Atualmente, é diretor-tesoureiro da Adjori-SP e vice-presidente do Sindicato das Empresas Proprietárias de Jornais e Revistas do Estado de São Paulo (Sindjori-SP).

Durante a realização do Congresso de Jornais em Macaé, semana passada, o jornalista e editor do JORNAL DA REGIÃO (JR), Célio Figueiredo, teve a oportunidade de conhecer e conversar com Evaldo Vicente (EV), que afirmou sua paixão pela história literária do escritor cantagalense Euclydes da Cunha. A seguir, uma entrevista com o jornalista.

JR – Quando começou a gostar da história de Euclydes da Cunha, e por quê ? Há quantos anos estuda a vida do escritor?

EV – Piracicaba sempre teve bons estudiosos da vida e da obra de Euclydes da Cunha, destacando-se o professor Benedito de Andrade (falecido), o meu sempre mestre Antônio Messias Galdino (advogado e jornalista, com quem sempre convivi, vereador e ex-presidente da Câmara) e Sílvio Ferraz de Arruda, cujo curriculum é invejável, autor de vários livros: é advogado em São Paulo; Adriano Nogueira (falecido), escritor de primeira; o folclorista João Chiarini, Cecílio Elias Netto (brilhante, com mais de 20 livros publicados) e outros que, no Jornal de Piracicaba, fizeram três edições especiais sobre Euclydes. Eu, aos 12 anos, tive contato com a edição de 1966. Ginasiano, incentivado por tantos amigos, comecei a estudar com ajuda de professores no ginásio e do colégio. Depois, passei algum tempo na imprensa de São Carlos, já aos 17/18 anos, e o redator-chefe era Clóvis Moura (falecido), autor do livro ‘Introdução ao Pensamento de Euclydes da Cunha’, que viria a escrever ‘Rebeliões da Senzala’, num contraponto ao ‘Casa Grande’ e ‘Senzala’, de Gilberto Freire.

E, daí por diante, vieram as semanas euclidianas (eu representei uma escola de São Carlos em 1972). Conheci, depois, Adelino Brandão, de Jundiaí, euclidiano do nascimento à morte; depois, o professor Márcio José Lauria, o grande incentivador de todos, tantos cuja lista seria imensa.

JR – Fale um pouco sobre a exposição sobre Euclydes da Cunha realizada em Pequim, em 1959?

EV – Para comemorar os 50 anos da morte de Euclydes da Cunha, foi feita uma exposição sobre ‘Os Sertões’, e também houve a primeira tradução resumida da obra para o chinês. O embaixador do Brasil na China era um entusiasta da obra euclidiana e sua esposa, sobrinha do poeta Gustavo Teixeira, dona Maria de Lourdes, conta isso em livro. Eles já faleceram. Só um do porte de Euclydes da Cunha mereceria tão profundos estudos assim.

JR – É verdade que o ex-presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, é euclidiano?

EV – Todo sociólogo que passar pelo Brasil ou quiser analisar o Brasil não tem condições de ficar longe de Euclydes da Cunha. FHC não foi diferente: reuniu, em livro, artigos sobre pensadores que fundaram o Brasil. Jamais o autor de ‘Os Sertões’,  “À Margem da História”, e etc., ficaria fora desse grupo tão selecionado em que estudos lógicos e paixão pelas letras mostraram o povo brasileiro de corpo e alma. “O sertanejo é, antes de tudo, um forte”. Isto basta para sintetizar tudo isso. Somos, todos, antes de tudo, fortes.

JR – Fale um pouco sobre o jornalista Euclydes da Cunha e seu trabalho publicado no jornal O Estado de São Paulo.

EV – O trabalho no jornal O Estado de São Paulo foi de um repórter, chamado de correspondente de guerra. Júlio Mesquita, então diretor, solicitou ao Exército brasileiro encaminhar o mais brilhante de todos: Euclydes da Cunha. Fez as matérias em termos de jornal, apenas como relato, mas foi no livro ‘Os Sertões’, baseado nas anotações, é que fez a denúncia forte, tão forte que, sabem os políticos, abalou a novel República.

JR – O que representa o livro ‘Os Sertões’?

EV – É a epopeia que leva os estudiosos a entenderem o que foi o movimento liderado por Antônio Conselheiro, contestado pelos conservadores da época, e que não sabiam, ainda, que só o diálogo em todos os sentidos, de Norte e a Sul, de Leste a Oeste, poderia construir uma nação. Teria sido mais rápido o entendimento da sociedade brasileira sobre si mesma se erros grosseiros não tivessem sido cometidos como os do Poder Judiciário em Juazeiro, Bahia. ‘Os Sertões’ mostra que o povo precisa ser entendido em seus problemas, por mais simples que sejam, pelas instituições que se colocam acima de tudo e de todos. Por isso, reafirmo: o livro ‘Os Sertões’ vale pela denúncia, bem feita, no mais alto estilo euclidiano. Além do “sertão ter virado mar”, pela represa, é bom salientar que, em termos de civilização, tudo já aconteceu e está acontecendo a cada dia que passa nos contrapontos sociais, nas grandes cidades e do campo.

JR – Algum fato curioso envolvendo a terra natal de Euclydes da Cunha e que tenha conhecimento?

EV – Para mim, Cantagalo sempre será um mito, até eu conhecer a cidade em si, pois leio o nome Cantagalo desde os 12 anos, por ter sido berço de Euclydes Rodrigues Pimenta da Cunha, no Rio de Janeiro, e até parece que o próprio nome traduz o que faria seu filho ilustre no futuro: dizer alto, denunciar firme, avisar que havia um erro na nova República (cantando alto, como canta o galo…).

JR – Qual a mensagem que poderia dar para a população de Cantagalo, principalmente o distrito de Euclidelândia (onde está a fazenda onde nasceu Euclydes da Cunha).

EV – Tenha orgulho, sempre, do município de Cantagalo, onde nasceu Euclydes da Cunha. E a Fazenda Santa Rita, ou distrito, deve sentir-se honrada em receber o nome de Euclidelândia, terra de Euclydes da Cunha. 

A Santa Rita, padroeira, para os devotos, continuará com seu valor espiritual que em nada altera por denominação. Seria bom que o município de Cantagalo, por sua Secretaria de Cultura, conseguisse – como apoio de todos os estudiosos – fazer um “vade mécum” para que se tenha noção exata do que é, como escritor e poeta, o engenheiro e professor de lógica Euclydes da Cunha.

Na minha simplicidade de estudante em 1972, escrevi um pequeno trabalho, pequeno, para registrar a passagem dele, Euclydes, por São Carlos, onde construiu e reformou escolas, o que fez em várias cidades, em apenas 43 anos de vida, sem política, sem eleições. Quanto à vida matrimonial, entendo melhor caminhar pelo respeito à memória dele, da esposa e da própria família.

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