“Alvorada & seu fundador – Severino Pereira da Silva”, por Celso Frauches

Alvorada & seu fundador - Severino Pereira da Silva

Não espere por grandes oportunidades. Agarre ocasiões pequenas e faça-as grandes. Não são as oportunidades que têm que ser grandes, são os homens. É VOCÊ!

O personagem da semana de nossa coluna é um claro exemplo da afirmativa acima.

Em 1964, visitou Cantagalo e teve uma audiência com o prefeito Henrique Frauches, um engenheiro do Grupo Mauá (Companhia Nacional de Cimento Portland – CNCP), com a participação de dois grupos cimenteiros internacionais — Lafarge, da França, e Lone Star Ind, dos Estados Unidos. O Grupo havia adquirido a Fazenda Saudade, no antigo distrito de Santa Rita do Rio Negro (Euclidelândia). Nessa fazenda nasceu Euclides da Cunha.

O engenheiro da Mauá disse ao prefeito que, em Itaboraí, a fábrica já estava garimpando a matéria-prima do cimento a 70 metros abaixo do nível do mar. Os dirigentes da fábrica pediam, em troca da instalação da fábrica em Cantagalo, o asfaltamento da estrada que liga Euclidelândia à RJ-116. O prefeito Frauches intercedeu junto ao governador Paulo Torres, um cantagalense, e este não se interessou pela obra, que não foi autorizada. Até hoje essa estrada não foi asfaltada.

Mesmo nessas condições, o empresário empreendedor Severino Pereira da Silva fundou a fábrica de cimento Alvorada, no distrito de Euclidelândia, em 3 de outubro de 1958, na fazenda Alvorada.

Quem me chamou a atenção para esse pioneiro foi o amigo Carlos Alberto da Silva Araujo, irmão de Angela, minha esposa. Ele foi um dos primeiros colaboradores da fábrica. Conheceu e conviveu com Severino, reconhecendo nele valores imprescindíveis para o empreendimento da Alvorada. Um empresário além de seu tempo.

Severino e o filho Carlos Alberto fazem parte da história da Alvorada e do desenvolvimento socioeconômico de Cantagalo, incluindo Macuco e Cordeiro. Mas não são reconhecidos como tal pelos poderes públicos do município.

O Blog Ponto de Vista narra a história vitoriosa de Severino. Ele nasceu em Taquaritinga do Norte–PE, em 1895. Caçula de uma família numerosa, partiu cedo para Recife, estudando comércio e trabalhando em uma loja de tecido na qual aprendeu de tudo, desde venda até a parte administrativa. Nesse período, tem como companheiro de quarto e de loja, outro empreendedor, Assis Chateaubriand, que na época disse a Severino que sairia para trabalhar em um jornal próximo à loja ou, então, venderia tecido pelo resto de sua vida.

 

Alvorada & seu fundador - Severino Pereira da Silva
Severino a esquerda, de chapéu preto

 

Severino foi trabalhar em uma distribuidora de tecidos, a maior do nordeste, Alves de Brito & Cia. “Chatô”, como era conhecido Assis Chateaubriand, que dá nome a um município no Paraná, dominou por décadas o mercado de mídia no Brasil, com destaque para a revista O Cruzeiro e a rede de TV Tupi.

Como caixeiro viajante, Severino percorreu diversos estados nordestinos, com uma tropa de mais de trinta animais, que ficou conhecido como “trem de mulas”.

De perfil radicalmente empreendedor e honesto nos negócios que desenvolvia, Severino volta ao Recife e passa a gerenciar a loja. Logo depois, recebe um convite para se tornar sócio da empresa em uma filial na cidade do Rio de Janeiro.

Em 1931, com a queda da economia mundial, o governo de Getúlio Vargas proíbe a importação de máquinas e peças de grande porte. A partir desse decreto, Severino passa a comprar fábricas de tecidos em falência. Recupera-as e revende-as. Em 1937, compra a Cia. Aliança. Vende os equipamentos e se associa a uma família mineira, compradora de parte das máquinas, fazendo no terreno um empreendimento imobiliário com prédios comerciais e um conjunto habitacional no jardim Laranjeiras, que existe até hoje.

O grande negócio de Pereira da Silva acontece em 1939, quando são oferecidas a ele duas fábricas de tecido em Sorocaba–SP.

Com a visão empreendedora, percebe que pagaria as fábricas com o estoque existente em seus depósitos. Em 1941, quando assume as fábricas, a segunda guerra provocou queda da produção e exportação de fábricas na Europa. Essa guerra, iniciada por um louco que governava a Alemanha, fez com que as fábricas de Severino ganhassem o mercado de exportação a países da América do Sul, África e Ásia.

Surge, em 1945, a fábrica de cimento Paraíso, em Italva–RJ, a primeira do que viria a ser a Companhia de Cimento Portland Paraíso. Depois vieram as fábricas Barroso, em Minas Gerais, a Alvorada, a Goiás, e a Tubazém, no Espírito Santo.

O conglomerado industrial de Severino chegou a ter mais de onze mil funcionários na década de 80 do século 20. O que foi um império industrial começou a ruir com a morte do patriarca, em 1986, evento agravado com a partilha da herança entre os filhos. O grupo cimenteiro foi vendido pelas filhas e genros ao maior grupo cimenteiro do mundo, a Holcim. Já a parte de tecido, que ficou com o filho Carlos Alberto, começou a cair com a entrada de tecidos asiáticos que oferecia preços muito abaixo do que o preço de produção nacional. Não só a Companhia Nacional de Estamparia, mas muitas outras fábricas do ramo caíram com a produção. E atualmente existe apenas uma das fábricas de tecido, que por ironia do destino, foi uma das duas primeiras fábricas compradas em Sorocaba: a Estamparia.

Severino e seu filho deram vida econômica à região, em um momento de crise. A queda da era do café e da pecuária, cortou empregos e salários, propulsores do desenvolvimento econômico de qualquer região. Cantagalo, Cordeiro e Macuco sofreram com o fim da era do café e da pecuária. Em particular, com a extinção da ferrovia que ligava essa região a Niterói e ao Rio de Janeiro.

 

Alvorada & seu fundador - Severino Pereira da Silva

 

O início da construção da cimenteira Alvorada, ao final de 1968, a primeira das três fábricas que atuam na região, foi um novo marco em nossa economia, que começou com o ouro, por iniciativa do garimpeiro Manuel Henriques, o Mão de Luva, em 1760.

Uma das primeiras providências de Severino, após a construção da fábrica, foi erguer o prédio para a instalação de uma escola. Coube ao governo fluminense ali criar a Escola Estadual Helênio Freire Verani.

Com a construção da fábrica Alvorada teve início a era do calcário, que trouxe emprego e renda para Cantagalo, Macuco e Cordeiro. O mercado, propulsor do desenvolvimento, fez com que outros grupos cimenteiros também construíssem suas fábricas em Cantagalo.

O que seria desses três municípios, especialmente Macuco, caso não houvesse este polo gerador de empregos e salários diferentes dos praticados em pequenos municípios da região serrana fluminense, como Macuco, por exemplo, que chegou a pertencer ao distrito de Santa Rita do Rio Negro e, mais tarde, ao município de Cordeiro.

A construção da Alvorada gerou mais de duas mil vagas de trabalho durante o período de obras. O mesmo acontecendo com a construção das outras fábricas. Com a inauguração, a Alvorada chegou a trabalhar com mais de 450 funcionários diretos. As empresas terceirizadas, prestadoras de serviços às fábricas de cimento, são responsáveis por parte desse desenvolvimento.

Em decorrência da terceirização, a indústria metal mecânica, por exemplo, se expande, fazendo com que muitas destas novas empresas passem a atuar no mercado nacional como prestadoras de serviços especializados. Essas empresas foram criadas, na sua maioria, por ex-funcionários da Alvorada, Votorantim e Mauá, que passaram a usar a experiência adquirida no período em que trabalharam nas cimenteiras.

São pessoas como os Pereira da Silva, os Ermírio de Moraes, do Grupo Votorantim, e esta nova geração de empreendedores da região serrana fluminense que deveriam ser sempre lembrados quando se fala na evolução de Cantagalo, Macuco e Cordeiro.

Severino Pereira da Silva é mais uma personalidade que contribuiu para o desenvolvimento socioeconômico do município de Cantagalo, fazenda parte inseparável na nossa história.

Talvez nem todos reconheçam seu imenso valor, mas a História dá voltas e, sempre, estes ilustres nomes serão lembrados e reconhecidos como marcas indeléveis dos que realmente fazem do trabalho a alavanca poderosa do progresso.

 

Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.
Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.

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