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Vou interromper a minha “viagem” pela Praça João XXIII, mais conhecida como a “Praça dos Melros”, a fim de abrir espaço para o jornalista, cronista e escritor José Lins do Rego, apaixonado por Cantagalo e sua gente, visível na crônica “Cantagalo”, publicada em “O Cantagalo”, em fevereiro de 1950.
Cantagalo, por José Lins do Rego
Eu havia dito ao companheiro: ‒ “Você vai conhecer a melhor gente deste mundo”.
O ônibus chegou em Cordeiro, e tivemos que fazer baldeação para outro carro. A tarde de chuva escondia as belezas do campo florido. As acácias amarelas pingavam como um pranto copioso. A estrada desmanchava-se em lama. Quando entramos em Cantagalo, esperava-nos, de guarda-chuva, o amigo Cristovão, o bom Cristovão, que vive para servir e agradar. Era assim uma espécie de sentinela avançada do povo. E, logo todos os amigos começaram a caprichar no melhor e mais fino agrado. Cantagalo, outra vez, encantava-me de coração a dentro. No domingo de manhã, o meu companheiro não era mais que um escravo dos meus amigos. Apesar da chuva, não perdemos um minuto sequer. O hotel novo virava-se para a praça dos melros, sem arrogância, feliz de estar ali, debaixo da proteção dos pássaros que enchem as madrugadas de cantorias mais doces que o mel das abelhas do Cristovão. Vimos a fazenda do “Gavião”, na sua majestade, vimos as terras do dr. Pita lavradas ao ronco do trator. Mais tarde ouvi, no almoço de príncipe que me ofereceram, os magníficos oradores que me tocaram a alma. E a amável lembrança das senhoras cantagalenses, que transformaram num bolo de sensação a minha querida “Eurídice”, doce como o favo do jati.
Fui homem feliz nos braços dos meus amigos eternos. O meu companheiro voltou, todo ele, de Cantagalo. Pudera… Quem resistirá à força de corações tão generosos? A terra que deu Euclides da Cunha, uma natureza do Velho Testamento, parece, no entanto, um manancial daquele leite da ternura, que não se esgotará nunca, mesmo quando os corações dos homens forem de pedra.
O ramo de flores que me mandou a família distante, aquela hortência rósea, na frescura do seu desabrochar, deu-me a certeza que este mundo caluniado de Deus, não é um mundo tão feio como o pintam.
ANOTAÇÕES
Cristóvão Pacheco da Silveira. Segundo o meu primo Roberto Robadey Jr., neto do “seo” Cristóvão, este era sobrinho de Honório Pacheco, casado com Jovita Pires da Silveira, dono do Hotel Santa Tereza, pessoa muito querida em Cantagalo. A residência da família era em um casarão, com sacada, em frente à Delegacia, hoje um edifício. Era, realmente, “o doce Cristovão”.
Cantagalo Turismo Hotel. Construído por empresários cantagalenses e inaugurado em 1948. A partir de 1955, foi arrendado por Jovelino Ferreira d’Azevedo, um empreendedor carioca que Cantagalo abrigou.
José Lins do Rego. José Lins do Rego Cavalcanti (1901/1957) foi romancista e jornalista. Nasceu no Engenho Corredor, Pilar, PB, em 3 de junho de 1901, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 12 de setembro de 1957. Formou-se, em 1923, na Faculdade de Direito do Recife, criada por D. João VI. Foi nomeado, em 1925, promotor em Manhuaçu, MG. Casado, em 1924, com D. Filomena (Naná) Masa Lins do Rego, transferiu-se, em 1926, para a Maceió (AL), onde passou a exercer as funções de fiscal de bancos até 1930 e fiscal de consumo de 1931 a 1935. Na capital alagoana, tornou-se colaborador do Jornal de Alagoas e passou a fazer parte do grupo de Graciliano Ramos, Raquel de Queirós, Aurélio Buarque de Holanda, Jorge de Lima, Valdemar Cavalcanti, Aloísio Branco e Carlos Paurílio. “O Cantagalo” publicou algumas das crônicas de José Lins do Rego, quando de sua permanência em nossa cidade. Em Maceió publicou o primeiro livro, Menino de engenho (1932), obra que se revelou de importância fundamental na história do moderno romance brasileiro. Em 1935, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde passou a residir. Foi nomeado fiscal do imposto de consumo. Integrando-se plenamente no ambiente carioca, continuou a fazer jornalismo, colaborando em vários periódicos com crônicas diárias. Romancista, sua obra baseia-se em memórias e reminiscências. Seus romances levantam todo um sistema econômico de origem patriarcal, o cangaço e o misticismo. O autor desejaria que a sua obra romanesca fosse dividida: “Ciclo da cana-de-açúcar”: Menino de engenho, Doidinho, Banguê, Fogo morto e Usina; “Ciclo do cangaço, misticismo e seca”: Pedra Bonita e Cangaceiros; “Obras independentes”: a) com ligações nos dois ciclos: O moleque Ricardo, Pureza e Riacho Doce; b) desligadas dos ciclos: Água-mãe e Eurídice. Eleito membro da Academia Brasileira de Letras, em 15 de setembro de 1955, ocupou a Cadeira 25, na sucessão de Ataulfo de Paiva. Recebido pelo Acadêmico Austregésilo de Athayde, em 15 de dezembro de 1956. Recebeu o Prêmio da Fundação Graça Aranha, pelo romance Menino de engenho (1932); o Prêmio Felipe d’Oliveira, pelo romance Água-mãe (1941), e o Prêmio Fábio Prado, pelo romance Eurídice (1947).
Celso Frauches é professor, escritor, pesquisador, ex-secretário Municipal de Cantagalo e consultor Especialista em Legislação