“Até que ponto vai a nossa responsabilidade?”, por Amanda de Moraes

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O ser humano possui capacidade de adaptação e uma cultura de socializar-se, ainda que não tenham o mesmo sobrenome. Em tempos difíceis, a resiliência humana pode chamar a atenção. Catástrofes, enlameadas por dor, perdas e desolações são afagadas pela solidariedade de milhares de pessoas que se unem para tornar uma tragédia um pouco menos difícil.

Em meio a provações, as virtudes aparecem. Não são autoproclamadas em tempos de bonança, apesar de a vaidade gostar de um elogio gratuito: “Fulano é honesto.” No entanto, a vida nunca apresentou a real possibilidade de não o ser. De forma simplificada, a virtude é um comportamento do ser humano, que está além da teoria, testada pelas circunstâncias da convivência.

Essas situações também demonstram o outro lado da mesma moeda. Em meio ao caos, as tremendas falhas emergem, demonstrando a dicotomia humana. Exemplo: numa calamidade pública, enquanto alguns prestam auxílio, outros se aproveitam das condições para tirar vantagem, desde a mais sutil a outras com requintes de crueldade.

As ocasiões extremas (perdas, iras, dores) são oportunos momentos para a investigação do que existe dentro de nós. Eis uma das tantas questões da condição humana: nascemos bons e somos corrompidos pela sociedade?

Um dos filósofos mais importantes do mundo, Jean-Jacques Rousseau, chegara a afirmar que o ser humano seria naturalmente bom, em Estado de Natureza, anterior à constituição da sociedade civil, ou seja, uma hipotética ausência de maldade.

Ao refletir sobre o tema, William Golding, Nobel de Literatura (1983), em sua clássica obra Senhor das Moscas (Cia. das Letras), narra a história fictícia de meninos ingleses que, perdidos em uma ilha selvagem, criam uma estrutura de organização civil para sobrevivência. Tem-se uma liderança democraticamente eleita (o menino Ralph). Em questão de tempo, começa a sofrer oposição de Jack, um garoto indomável, que utiliza o medo como forma de controle. Dias depois, as maiores barbáries começarem a acontecer. Da educação inglesa ao estado de natureza, Golding descreve a alma humana sem nenhuma ingenuidade.

Para acrescentar, o antropólogo norte-americano Napoleon Chagnon analisa o hipotético estado pacífico da população ianomâmi. Ao estudar comunidades isoladas entre a fronteira da Venezuela e o Brasil, o professor da Universidade de Missouri descreve comportamentos violentos, como disputas por mulheres e territórios.

Para compreender a sociedade, é preciso estudar o ser humano e a sua capacidade para o bem e para o mal, para os vícios e para as virtudes. Tendemo-nos a nos identificar, no plano pessoal, mais com a bondade, menos com a maldade. Somos seres sociais, na essência. Por isso, é o ser humano parte direta do que existe em sociedade. Se buscamos um planeta no qual humanismo, ética e justiça prevaleçam, a lei de amor ao próximo (fazer pelo outro o que faríamos a nós mesmos) deve ser a base de tudo – em casa, no condomínio, no trânsito, no trabalho. E você? Acredita na humanidade?

 

Amanda de Moraes Estefan é advogada, no Rio de Janeiro, e sócia do escritório Mirza & Malan Advogados. Ela é neta do ex-prefeito de Trajano de Moraes, João de Moraes
Amanda de Moraes Estefan é advogada, no Rio de Janeiro, e sócia do escritório Mirza & Malan Advogados. Ela é neta do ex-prefeito de Trajano de Moraes, João de Moraes

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