“Bira: vida & morte”, por Celso Frauches

Bira: vida & morte

“Não morro, entro na Vida”. (Santa Teresinha do Menino Jesus)

Na poesia e na fé, a morte foi definida, meditada, expressada das mais variadas formas. Sendo a única certeza que temos desde que nascemos, a morte sempre nos surpreende, sobretudo quando vem pela violência. Numa comunidade pequena como a nossa, perder alguém por assassinato, sempre próximo de todos, a todos atinge com força, provoca nossa solidariedade.

No início da semana finda, fomos surpreendidos com o brutal assassinato do amigo Bira, motorista da Prefeitura há décadas e taxista nas horas vagas. Aos sábados e domingos, ele era um dos que trabalhava com o seu táxi.

Conheci o Bira quando me mudei para Cantagalo, no final de 2020. Passei a residir com a minha esposa, Angela, na Vila Pitta. Como tinha dificuldade para caminhadas um pouco longas, eu e Angela usávamos o táxi do Bira para irmos à missa dos domingos, às 10h. Depois começamos a fazer com ele outras viagens, aqui mesmo dentro de nosso município: Floresta, Boa Sorte, Euclidelândia. Se havia festa no Sítio 3S, na Taquara, era ele que nos levava e buscava.

Nesses trajetos, sempre batíamos um papo. O Bira tinha assunto para tudo. Em política, como cidadãos da direita, ele era um defensor ferrenho do Bolsonaro, como eu. Ele foi motorista de vários prefeitos. Tinha causos para contar de todos com os quais trabalhou mais de perto. Admirava muito Wilder de Paula.

 

Bira: vida & morte

 

Assíduo na internet, havia muitos causos ali colhidos, sobretudo os mais exóticos, fora do comum. Conhecíamos, por suas narrativas, cidades perdidas da Amazônia, creio que acreditava, ou fingia acreditar para dar mais credibilidade às suas narrativas, em discos voadores e trocávamos figurinhas sobre isso. Quantas risadas saborosas demos juntos com algumas histórias hilárias.

Acabamos ficando amigos. Nós o perdemos para a violência de dois ou três imbecis. Oramos por ele, um ser complexo, mas amigo.

Bira (Ubiratan) nasceu na cidade do Rio de Janeiro, em 31 de outubro de 1961. Lá, estudou no Colégio Barão de Amparo. Completando a educação básica, fez vestibular para Direito na Universidade Gama Filho, no Méier, na cidade carioca. Não conseguiu concluir o curso.

Trabalhou desde os dezesseis anos para ajudar a mãe nas despesas domésticas, em sociedade com o padrasto na propaganda por meio de outdoors, mas desfez a sociedade aos 24 anos.

Bira veio para Cantagalo para morar com o pai, o taxista Sady, e trabalhou com venda de sementes de braquiária, inicialmente. Depois tentou, mais uma vez, o ramo da propaganda. Como não teve êxito, começou a trabalhar como taxista, em 1990.

Fez o concurso para motorista na Prefeitura de Cantagalo. Aprovado, iniciou o seu trabalho em 4 de maio de 2006, na Secretaria de Saúde.

 

Bira: vida & morte

 

Sua vida foi brutalmente interrompida aos 62 anos, no dia 23 de setembro de 2024. Foi assassinado, no desempenho de sua função de motorista, em Cantagalo, no distrito de Boa Sorte, deixando viúva sua esposa, Cleia, os filhos Breno e Taís, e uma netinha, Sofia Maria, que ele amava de modo especial.

Casado com Cleia desde 16 de março de 1958, Bira dedicou sua vida ao trabalho e à família. Era um perfeccionista, pois gostava de tudo feito de modo perfeito, o que, muitas vezes, fazia-o parecer “chato”.

Bira tinha um único vício: o trabalho.

Pelo pouco tempo que convivemos, percebemos que ele tinha um coração generoso. De poucos amigos, mas os que tinha ele fazia de tudo para ajudar. Angela se emocionou ao ouvir da família, na missa de 7º dia: “Ele gostava muito de vocês”. E nós dele.

 

Bira: vida & morte

 

A família, profundamente sentida, na saudade e no luto, nos disse: “Estamos sentindo toda a dor deste mundo cruel. Ele já estava um pouco debilitado pela doença que nós conhecíamos bem. Bira mesmo dizia que não iria muito longe. Mas o que fizeram com ele foi muita crueldade”.

Com certeza, ele não merecia ter a morte que teve.

Cantagalo se entristeceu com a família, chorou com ela e se solidariza nestes momentos de dor.

A família nos pede que seja registrado que é muita grata às polícias Civil e Militar de Cantagalo. Os policiais foram ágeis e estão conduzindo o processo corretamente, a fim de que os assassinos sejam devidamente punidos.

A nós, resta-nos a consolação que vem da Palavra de Deus: “Quem crê em Mim, ainda que esteja morto, viverá; e todo aquele que vive e crê em Mim, nunca morrerá.” (João 11,25-26).

 

Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.
Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.

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