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Porto Marinho é uma comunidade rural, agrícola e pesqueira que se localiza às margens do Rio Paraíba do Sul, no distrito de São Sebastião do Paraíba, na divisa de Cantagalo com o município de Itaocara.
A identidade social de quem nasce na localidade de Porto Marinho não está associada muito proximamente a do distrito ao qual pertence, haja vista que quem nasce, ou é criado, em Porto Marinho não se reconhece como “paraibano”. Um dos fortes elementos identitários da comunidade é a agricultura de base familiar, realizada desde os primórdios do estabelecimento dos colonizadores naquela região; porém, muito além das variedades comerciais que são cultivadas naquele solo de excepcional qualidade, o produto que mais expressa os vínculos dos agricultores locais com a terra, com as suas tradições culinárias e societárias, é o “Arroz Anã de Porto Marinho”.
Esse cereal, cultivado naquela localidade por décadas, tem espaço privilegiado nas mesas dos moradores, que se negam a consumir o arroz comercial (“arroz de pacote”). Alimento básico daquela população, figura nas principais refeições do dia, e é também apreciado na feitura de pratos doces.
O “Arroz Anã de Porto Marinho”, denominado assim por conta da baixa estatura de sua planta, possui formato assemelhado ao arroz japonês, apresentando, porém, grãos ligeiramente menores; tem técnica de cozimento diferenciada e consistência e sabor peculiares, muito apreciados pela comunidade local e visitantes.
Seu processo de plantio, cultivo e tratos culturais, atesta o saber fazer específico desenvolvido pelos agricultores de Porto Marinho. Não envolve a utilização de adubos químicos ou mesmo pesticidas, nem qualquer tipo de adubo, seja químico ou orgânico. A época de plantio inicia-se em outubro, porém, a maioria dos agricultores opta por realizar a semeadura um pouco mais tarde, para que a planta não corra o risco de se dobrar pela ação dos fortes ventos e das chuvas mais intensas do início do período das águas, o que prejudicaria a produtividade das lavouras.
Entre o final de um ano e o início de outro, as terras destinadas a essa variedade já se encontram devidamente aradas e gradeadas, e o plantio de caroço (semente) ou em mudas inicia-se efetivamente. Em se optando pela primeira modalidade, em 5 ou 6 meses se efetua a colheita, porém, quando as mudas são utilizadas, esse tempo é encurtado, demandando por volta de 4 meses até o tempo da colheita.
Se a terra for “forte”, contendo muito nutrientes, como é o caso da imensa maioria das áreas cultiváveis em Porto Marinho, o plantio é feito no espaçamento de 60 cm por 40 cm. Em se plantando com espaçamento menor, o surgimento de folhas é muito intenso, prejudicando o surgimento dos cachos do arroz.
Após a colheita, que é realizada, na maioria dos casos, através de mutirão (“troca de trabalho”), o arroz é batido em “camas” ou utilizando pequenas máquinas de pilar, para que haja a separação entre os bagos e os talos.
Posteriormente, procede-se à secagem dos bagos do arroz. Esta última atividade é premente, visto que esse procedimento evita o apodrecimento do cereal e define sua durabilidade para o consumo. Como é de costume na comunidade, a secagem e ensacamento ocorrem nos lajedos de pedra que se encontram às margens do rio Paraíba do Sul.
Em regra a secagem ocorre em apenas um único dia e, ao se considerar as imprevisibilidades do tempo, há urgência em, depois de seco, rapidamente se concluir o processo acondicionamento do cereal em sacos, para ser retirado o quanto antes “da pedra”. Em se considerando as possíveis ameaças das chuvas de final de tarde, essa atividade é realizada com a celeridade devida, e envolve vários membros da família do agricultor.
Já colhido, seco e acondicionado em sacos, resta agora a atividade de “pilar o arroz anã”, para que se retire a casca de cada bago e possa, portanto, disponibilizá-lo ao consumo.
Na comunidade de Porto Marinho há na atualidade quatro pequenas máquinas de pilar arroz. As máquinas de porte reduzido são as preferidas dos produtores. Já as máquinas de grande porte são evitadas, pelo fato destas pilarem vários tipos deste cereal, havendo a possibilidade de mistura do “Arroz Anã de Porto Marinho” com outros tipos de arrozes que se acumulam no interior do mecanismo, maculando a pureza do “Anã”.
O “Arroz Anã de Porto Marinho” é conservado, em palha, em paióis, galpões ou câmaras fechadas para consumo da comunidade, como também para a venda, haja vista que sempre há grande procura por esta variedade na região.
Essa breve descrição do processo produtivo, do beneficiamento e dos aspectos societários que envolvem o “Arroz Anã de Porto Marinho”, demonstra a dedicação e o cuidado que uma pequena comunidade rural de Cantagalo, no interior do Estado do Rio de Janeiro, possui por um alimento.
Em aproximadamente meio século de cultivo, os agricultores de Porto Marinho preservaram as características da planta desse cereal diferenciado, desenvolveram tratos culturais específicos para cultivá-lo, engendraram estratégias de trabalho comunitário para dar conta das laboriosas tarefas de plantio, colheita e secagem e, através das técnicas desenvolvidas e das relações que travaram, inventaram formas de fazer e de se relacionar – inventaram tradições – que marcam profundamente aquela pequena comunidade às margens do rio Paraíba do Sul. E, por fim, com todo o cuidado e a dedicação dispensados ao arroz da variedade “anã”, deram-lhe nome e sobrenome: “Arroz Anã de Porto Marinho”.
Texto: Prof. João Bôsco de Paula Bon Cardoso