Jovem friburguense é campeão mundial no World Pro Jiu-Jitsu, em Abu Dhabi
Acredito que a maioria dos leitores atuais não conheceu o Dr. Lima Rocha, médico que viveu e trabalhou em Cantagalo durante muitos anos, sendo admirado e querido em nossa comunidade pelos seus conhecimentos médicos e modo de vida.
Dr. Lima Rocha era natural de Alagoas, nascido em Maceió, no dia 02 de junho de 1888, onde, na juventude, trabalhou como telegrafista.
Estudou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, hoje Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil. Uma vez diplomado, casou-se com Carmen Alonso, de nacionalidade espanhola.
Iniciou sua vida médica no estado de Mato Grosso, onde permaneceu por sete anos; passando, depois, para a cidade de Marília (SP), que se encontrava em seus primórdios, com muitas casas de madeira, como contava o Dr. Lima Rocha. De lá, passou para Cantagalo, onde permaneceu até o final de sua vida.
Sua residência era na rua Getúlio Vargas, onde funciona hoje a casa comercial Nomidi, mantendo, no mesmo local, o seu consultório médico, ponto em que exercia a ciência e arte de Hipócrates com sabedoria e caridade, a todos atendendo, independente da condição financeira. Praticava a medicina, também, na Casa de Caridade de Cantagalo (atual Hospital de Cantagalo).
Durante muitos anos Dr. Lima Rocha e Dr. Carvalho (meu querido pai) eram os únicos médicos em nossa cidade, mantendo grande amizade; sendo meu pai admirador da cultura médica e geral do seu colega. Certa vez, em conversa, o Dr. Lima Rocha começou a descrever, com tanto conhecimento e clareza, as várias conformações de crânios humanos, que meu pai me disse que nem nas aulas da faculdade de medicina viu tamanho conhecimento sobre o assunto.
Infelizmente, Dr. Lima Rocha era portador de uma cardiopatia que limitava suas atividades físicas. Quando tinha suas crises, meu pai ia atendê-lo, surgindo quase sempre esse diálogo:
– Lima Rocha, eu vou lhe aplicar tal medicamento, você está de acordo?
– Carvalho, hoje eu sou o doente. Faça o que você achar melhor.
Até nesse pequeno diálogo, Dr. Lima Rocha era ético.
Durante cinco anos, minha irmã Hebe foi filha única. Em uma das vezes que os dois médicos conversavam, meu pai começou a contar as proezas que a filha fazia. Em determinado momento, o Dr. Lima Rocha sorriu, dizendo:
– Carvalho, você precisa arranjar outro filho, tudo isso que sua filha faz é próprio da idade dela. Não é bom ter um só filho.
No ano seguinte eu nasci. Agradeço ao Dr. Lima Rocha o conselho que ele deu ao meu pai!
Na Faculdade de Ciências Médicas (UERJ) havia o Prof. Cruz Campista, livre docente, responsável pelo curso de Micologia, na cadeira de Parasitologia. Certa vez, em 1957, sabendo que naquela turma existiam dois alunos de Cantagalo, (Adrelírio Rios Gonçalves e Sebastião Cunha Gonçalves) disse o seguinte:
“Há em Cantagalo, um médico, Dr. Lima Rocha, que foi meu colega de faculdade, sendo o melhor aluno da turma; só não ficou no Rio de Janeiro por falta de condições financeiras; mas, pelos seus conhecimentos, era quem deveria estar aqui, lecionando nesta faculdade”.
Nas suas atividades médicas, Dr. Lima Rocha era auxiliado por sua esposa Da. Carmem, que era enfermeira.
O casal só tinha uma filha, de nome Olímpia. Quando jovem, foi estudar em Nova Friburgo, como aluna interna de um colégio católico. Lá contraiu tuberculose pulmonar, numa época em que não havia tratamento específico para a terrível doença, vindo a falecer em pouco tempo.
Em 1958, estando de férias na faculdade, vim passar alguns dias em Cantagalo, ocasião em que meu pai me disse que o Dr. Lima Rocha estava internado no Hospital de Cantagalo e que eu deveria visitá-lo.
Lá chegando, o encontrei em um quarto; bem cuidado pela esposa que o acompanhava; sentado em uma poltrona, com as mãos apoiadas nos braços da cadeira, olhar fixo para frente e a face completamente indiferente. Chocado com aquele quadro, disse para sua esposa: “Como pode um homem tão inteligente chegar a esse ponto depois de idoso…”. Ela, tranquilamente, me respondeu: “Meu filho, está tudo certo, nós precisamos ter saúde na mocidade, para poder trabalhar e preparar a vida para a velhice”. Jamais me esqueci dessa lição! O Dr. Lima Rocha era cuidado pelo Dr. Gastão Pinto Gomes, vindo a falecer pouco depois.
Dona Carmem ainda viveu cerca de dez anos, acometida de uma doença incurável que lhe causava dores, ficou entregue aos meus cuidados no Hospital de Cantagalo.
Pela manhã, quando passava a visita médica, perguntava se as dores estavam lhe incomodando muito. Ela, serenamente, me respondia:
“Não precisa passar nenhum medicamento contra as dores. Se elas forem muito fortes, eu lhe avisarei. Se Cristo sofreu, eu também posso sofrer”. Assim permaneceu até o falecimento, sem jamais pedir um analgésico.
Dr. Lima Rocha, Da. Carmem e a filha Olímpia se encontram sepultados no cemitério de Cantagalo. Após o primeiro lance de escadas, dirigindo-se para a direita, é o primeiro túmulo, de granito preto, baixo e simples, como o casal sempre procurou ser em Cantagalo.
Um cidadão que prestou tantos serviços médicos a nossa população recebeu poucas homenagens em Cantagalo. No salão nobre do Hospital de Cantagalo, existe o seu retrato, ao lado de outros benfeitores da instituição, enquanto o curso supletivo do Colégio Lameira de Andrade tem o seu nome como patrono, por ato publicado no Diário Oficial de 30/07/1973.
Júlio Carvalho é médico, ex-vereador e ex-provedor do Hospital de Cantagalo, e atualmente é auditor da Unimed de Nova Friburgo.