Enfim, o triunfo da verdade?

Com a provável vitória de Cantagalo no processo em curso perante o STF, espera-se o fim da contenda sobre a área do calcário. Esse território, que chegou a ser importante na era do café (inclusive abrigando fazendas de vulto, como a Mont Vernon), caiu no esquecimento logo após a queda do Império, por ser muito pedregoso e acidentado, portanto pouco adequado ao desenvolvimento da pecuária leiteira então emergente. Tanto que Cordeiro, ao se emancipar de Cantagalo (dezembro de 1943) nem fez caso da sua não inclusão no respectivo termo. Afinal, diziam os cordeirenses com certa empáfia: “vaca não come pedra”.

Porém, com a implantação da indústria cimenteira na área (década de 1970) e a consequente renda dela derivada, o novo município acordou, verificando que a divisão territorial, tal como ocorreu, não lhe foi tão favorável como imaginava.

Data de então a disputa pelo território. Segundo seus adeptos, o tão festejado Decreto Lei nº 1.055/43, que criou o município, apesar de louvável, cometeu erros redacionais imperdoáveis, dando aos acidentes geográficos aproveitados como divisas, denominações incorretas. Embora “querendo” (dizem eles) incorporar ao município de Cordeiro a área do calcário, as autoridades encarregadas de sua redação, por ignorarem a geografia local, deram ao Rio Negro o nome de Macuco, assim como ao Córrego Bom Vale o nome de Val de Palmas. E, com isso, retiraram “involuntariamente” do seu município a cobiçada área.

Começou a briga com a notificação da empresa Alvorada (antecessora da Holdercim) a recolher aos seus cofres (do município de Cordeiro) os tributos municipais; em seguida, ensejando a série de ações judiciais que terminou com a vitória de Cantagalo; por fim, apelando para o governador Leonel Brizola, que baixou o Decreto “interpretativo” nº 8.745/85, afinal também derrubado pelo Tribunal de Justiça ao decidir que o chefe do Executivo não pode, por simples decreto, alterar divisas intermunicipais.

À vista de tais reveses e da emancipação de Macuco, Cordeiro ensarilhou as armas, deixando ao seu rebento a tarefa de continuar a disputa. E o resultado foi ainda pior, porque o novíssimo município, em vez de se contentar com o território herdado, fez constar da respectiva lei emancipadora (Lei 2.497/95) a divisa antes pretendida por Cordeiro. Vale dizer: invadiu a área pertencente a Cantagalo. Foi quando o Tribunal de Justiça, acolhendo o Mandado de Segurança impetrado por Cantagalo (Proc. nº 277/96), corrigiu a irregularidade.

Macuco, todavia, não se deu por vencido. Com auxílio da Procuradoria da República, ajuizou, perante o STF, duas pretensões: primeira, no sentido da declaração de inconstitucionalidade da Lei nº 3.196/99 (Lei Aparecida Gama); segunda, pedindo o reconhecimento da divisa descrita na Lei nº 2.497/95, já derrubada pelo TJ ao julgar o MS nº 277, acima referido. Quanto ao primeiro pedido, foi até atendido, aliás para surpresa dos estudiosos do tema. E quanto ao segundo, ainda pendente de julgamento, espera-se que a Suprema Corte o denegue, confirmando as anteriores decisões judiciais e pondo fim à interminável disputa, que já dura mais de 40 anos.

*Clélio Erthal é ex-desembargador, ex-juiz federal e pesquisador da história de Cantagalo e região. Mais em www.cantagalo.rj.gov.br/index.php/filhos-ilustres/136-clelio-erthal.

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