“Mão de Luva e as origens de Cantagalo – 10”, por Celso Frauches

Uma das cidades mais belas e históricas de Minas Gerais, Ouro Branco, localizada a 100 km de Belo Horizonte, celebra o seu tricentenário. neste, fundado em 1724, como povoado de Santo Antônio de Ouro Branco.

Uma das cidades mais belas e históricas de Minas Gerais, Ouro Branco, localizada a 100 km de Belo Horizonte, celebra o seu tricentenário. neste, fundado em 1724, como povoado de Santo Antônio de Ouro Branco.

Leia a parte 1, a parte 2, a parte 3, a parte 4, parte 5, parte 6, parte 7, parte 8 e parte 9 deste artigo nos respectivos links.

 

As pesquisas de Rodrigo Oliveira

Abordamos, agora, outras pesquisas sobre a verdadeira origem de Manuel Henriques, o Mão de Luva, e do processo que redundou na sua condenação e degredo. São essas investigações acadêmicas que fundamentaram a dissertação de mestrado em História de Rodrigo Leonardo de Souza Oliveira¹, para a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFLF), aprovada pela comissão julgadora.

Em sua dissertação de mestrado, sob o título “Mão de Luva” e “Montanha: bandoleiros e salteadores nos caminhos de Minas Gerais no século XVIII (Matas Gerais da Mantiqueira): 1755-1786², o Prof. Dr. Rodrigo Leonardo de Souza Oliveira, com base em documentos citados em sua pesquisa, registra “Os banhos matrimoniais do Mão de Luva”, nos seguintes termos:

Querem casar Manuel Henriques, filho legítimo de Manuel Henriques Malho, e de Maria da Silva natural e batizado nesta Freguesia do Ouro Branco, e de presente morador na Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Guarapiranga, com D. Maria de Souza, viúva que ficou de Manoel da Costa Ferreira, filha legítima do Capitão Antônio de Souza Ferreira e de Florência Luiza de Miranda, natural, e batizada, e moradora na dita Freguesia de Guarapiranga, aonde ambos os contraentes tem satisfeito aos preceitos quaresmais (AEAM. Processo matrimonial de Manuel Henriques e Maria de Sousa. Data: 1º/1/1775, Local: Freguesia de Guarapiranga, Registro nº 6632, Armário 06, Pasta 664. p. 4)”. (grifos do autor).

Manuel Henriques nasceu em 1740 e foi batizado em Ouro Branco, nas Minas Gerais. Um brasileiro legítimo. O mesmo documento registra ainda que a mãe de Manuel Henriques era:

Maria da Silva mulher branca casada natural da Freguesia de Guaratinguetá do Bispado de São Paulo moradora no Chopotó Freguesia de Guarapiranga que vive de sua fazenda de idade que disse ter sessenta para setenta anos […], conhece muito bem ao justificante Manuel Henriques por ser este seu filho tido de legítimo matrimônio com Manuel Henriques Malho e que fora nascido, e batizado na Freguesia de Santo Antônio de Ouro Branco deste Bispado de Mariana, e que não está certa no dia, mês, e ano, mas sabe que o justificante há de ter trinta e quatro anos pouco mais ou menos, sendo padrinhos Francisco Vieira e Maria Pires, mulher do Capitão Vicente da Costa, moradores na Freguesia das Congonhas do Campo, e que não está certa no nome do pároco que administrou o sacramento do batismo ao justificante, mas de certo sabe ser o justificante batizado na dita freguesia, e mais não disse”.

 

Manuel Henriques, na criação artística do designer gráfico Arthur Consídera Abreu, no dia do casamento, em 1º de janeiro de 1775, com a viúva Maria de Souza
Manuel Henriques, na criação artística do designer gráfico Arthur Consídera Abreu, no dia do casamento, em 1º de janeiro de 1775, com a viúva Maria de Souza

 

E sobre o pai de Manuel Henriques:

Diz Manuel Henriques Malho, morador na Freguesia de Guarapiranga, filho legítimo de Antônio Malho e de Maria Pereira natural e batizado na Freguesia de São Lourenço da Vila de Mayorca Couto de Alcoubaça Arcebispado de Lisboa, que ele se acha justo para se [contrair] matrimônio com Maria da Silva Campos, viúva que ficou de Antônio Simões, cujo óbito tem já justificado, e porque para contrahirem o dito matrimônio lhes seja [permitido] dar em seus depoimentos, e justificar o suplicante […]”. (grifos do autor).

Rodrigo observa que, no processo anterior, fica evidente que a idade atribuída a Manuel Henriques, conforme relatado por sua mãe, era de cerca de 35 anos, ou até um pouco mais. No entanto, observa que seus pais se casaram somente em 1761 e que:

[..] dessa forma, acreditamos que os contraentes tinham um relacionamento amoroso antes mesmo da morte do esposo de Maria da Silva. Afinal, mesmo considerando que o dito havia falecido cerca de 10 anos, a possível idade de Manuel Henriques não passaria dos 30 anos […], a existência do líder do bando de Macacu pode ter sido fruto de um relacionamento que contrariava as “sagradas leis da Igreja Católica”: o adultério. Mais intrigante foi perceber que não houve testemunhas que pudessem impedir o casamento de seus pais”.

 

Igreja Matriz da freguesia de Santo Antônio de Ouro Branco, onde casou Manuel Henriques com Maria de Souza, que pertencia à Comarca do Rio das Velhas, da capitania de Minas Gerais. A cidade de Ouro Branco comemora o tricentenário este ano
Igreja Matriz da freguesia de Santo Antônio de Ouro Branco, onde casou Manuel Henriques com Maria de Souza, que pertencia à Comarca do Rio das Velhas, da capitania de Minas Gerais. A cidade de Ouro Branco comemora o tricentenário este ano

 

A excelente dissertação de mestrado de Oliveira deixa claro que Manuel Henriques era descendente de portugueses e não era o Duque de Santo Tirso, personagem que aparece na versão romanceada de Acácio Ferreira Dias. Aquele esclarece que as suas fontes são oficiais e comprovam uma parte da “procedência do Mão de Luva: filiação, idade, o nome de sua esposa, de seus padrinhos e alguns dados sobre o seu irmão Ignácio” (Processo matrimonial de Ignácio da Silva Campos Maciel e Ana Maria de São José. Ano: 1773, Lugar: Guarapiranga, Nº: 3136, Armário 03; Pasta 314, p. 3.). Paralelo a essa informação, Rodrigo diz que a mesma situação pode ser aplicada a outro irmão de Manuel Henriques, Felix da Silva.

Manuel Henriques tinha três irmãos e um enteado, filho de sua esposa em casamento anterior. Esse era seu estafe familiar, que o acompanhou e o ajudou nos garimpos do “Certão dos índios bravios”.

 

¹ Rodrigo possui pós-doutorado na Universidade do Rio de Janeiro; é doutor na linha de pesquisa “História Social da Cultura” no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

² Disponível em: <https://repositorio.ufjf.br/jspui/handle/ufjf/2927>. Acesso em: 15 nov. 2020.

 

Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.
Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.

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