“Mão de Luva e as origens de Cantagalo – 12”, por Celso Frauches

Os caminhos de Mão de Luva e seus companheiros de garimpagem

Leia a parte anterior deste artigo (parte 11) neste link.

 

Caminhos do Mão de Luva

Segundo pode se depreender das pesquisas de Sebastião Carvalho e Rodrigo de Oliveira, esgotadas as minas auríferas da região de Guarapiranga, hoje Piranga, nas Minas Gerais, Mão de Luva migrou com os seus irmãos, outros garimpeiros, escravos e libertos, para o então desconhecido “certão de índios bravios”, mais tarde Sertões de Macacu e Novas Minas de Cantagalo.

Saindo de Guarapiranga, atravessou os rios Pomba e Paraíba do Sul, no povoado de Porto do Cunha, e veio abrindo trilhas pela mata densa. Ao chegar a um determinado ponto, encontrou dois rios e uma entrada para um vale, por onde corria um riacho, com pequeno espaço entre aos morros, na entrada. Era o bairro conhecido hoje como Triângulo dos Ferroviários.

Resolveu acessar o vale, abrindo picadas nas margens do citado riacho, mais tarde conhecido por “Mão de Luva”. Era o lugar ideal para construir um povoado, tendo em vista a fartura de madeira, de sapé, de água e livre dos aventureiros que passassem por perto, tendo em vista o difícil acesso.

Esse local, a partir de 1786, após o presídio de Mão de Luva e seus companheiros de garimpagem, passou a ser denominado Novas Minas de Canta Gallo, reconhecido, pelo Reino Unido Portugal, Brasil e Açores, como distrito do município de Santo Antonio de Sá. Mais tarde, sucessivamente, vila São Pedro de Cantagalo (Município) e, por fim, Cantagalo.

Mão de Luva e seus companheiros de garimpagem exploraram ouro de aluvião praticamente em todos os rios e riachos da região serrana fluminense.

O rio conhecido pelo nome de Dois Rios é formado pela confluência do Rio Negro com o Rio Grande, junto à divisa dos municípios de São Fidélis, Itaocara e São Sebastião do Alto, e deságua no rio Paraíba do Sul, sendo um de seus principais afluentes pela margem direita.

A área de atuação do Comitê Rio Dois Rios corresponde ao território da Região Hidrográfica Rio Dois Rios (RH-Rio Dois Rios ou RH-VII), que se situa ao longo da região central fluminense até a região norte. Essa Região Hidrográfica corresponde às bacias dos rios Negro, Dois Rios e do Córrego do Tanque, bem como à bacia da margem direita do Médio Inferior do rio Paraíba do Sul, cujos rios principais são o Bengalas, Negro, Grande e Dois Rios, com foz no município de São Fidélis. Outros cursos d’água relevantes dessa Região: Ribeirão das Areias e o Rio do Colégio. Os municípios de Bom Jardim, Cantagalo, Cordeiro, Duas Barras, Itaocara, Macuco e São Sebastião do Alto fazem parte integralmente da região. Parcialmente incluídos estão Carmo, Nova Friburgo, Santa Maria Madalena, São Fidélis e Trajano de Moraes.[1].

 

Os caminhos de Mão de Luva e seus companheiros de garimpagem saindo de Minas Gerais para o "Certão dos índios bravios" (Ilustração do designer gráfico cantagalense Arthur Consídera Abreu)
Os caminhos de Mão de Luva e seus companheiros de garimpagem saindo de Minas Gerais para o “Certão dos índios bravios” (Ilustração do designer gráfico cantagalense Arthur Consídera Abreu)

 

O mapa de atuação do Comitê Rio Dois Rios[2] nos dá uma visão do trajeto dos rios explorados por Manuel Henriques e seus companheiros de garimpo.

Esse mapa mostra claramente os caminhos de Mão de Luva após a sua fixação no local onde se encontra a cidade de Cantagalo, percorrendo os rios citados, do atual município de Nova Friburgo ao de São Fidélis, incluindo córregos como o Lavrinhas, o Mão de Luva e outros espalhados pela região das Novas Minas de Canta Gallo.

Romyr Conde Garcia, graduado em história pela UFF, mestrado e doutorado em história econômica pela USP, em denso artigo publicado na Revista Unifeso – V. 9, N. 1 (2022), sob o título O mão de luva e os sertões de Serra acima: Garimpos clandestinos e conflitos sociais no Brasil Colônia, sintetiza em sua conclusão sobre o garimpeiro Mão de Luva:

Concluindo, os Sertões do Macacu era mais uma região mineradora clandestina do que uma via de descaminho do ouro de Minas Gerais. Sendo que: a) Mão de Luva era um garimpeiro, oriundo de Minas gerais, senhor de escravos, líder de um grupo de garimpeiros que lavravam ilegalmente nos Sertões do Macacu; b) Manoel Henriques tinha relações muito “interessantes” com altos cargos da administração mineira que o possibilitou a se estabelecer e garimpar tranquilamente nos sertões do Macacu; c) não podemos afirmar se era branco ou pardo, nem temos informações de que era realmente um bandido, tal como afirma Laura Mello e Souza, mas sim, que era um minerador que retirava ouro suficiente para comprar e manter os seus escravos; d) este indivíduo, querendo ou não, pertencia ao eixo principal da economia mineira, isto é, ele estava intimamente ligado à vida produtiva do país, mesmo que estivesse ilegalmente localizado. Poderia até ser chamado de contrabandista ou descaminhador do ouro, mas acreditamos que ele contrabandeava mais o ouro que retirava do Novo Descoberto que os desvios de Minas Gerais. Na verdade, encontramos mais ouro saindo dos Sertões do Macacu para a região das Minas, que ao contrário. Por outro lado, o Mão de Luva era um chefe: líder de um bando. Considerado até mesmo pelo vice-rei D. Luís de Vasconcellos, como homem astucioso e audacioso. Por isso, bem que poderíamos enquadrá-lo próximo à concepção de E. Hobsbawm como “um homem que se faz respeitar”. E tal qual o bandido nobre, “iniciou a sua marginalidade não pelo crime, mas como vítima da injustiça, ou pela perseguição, pelas autoridades, devido a algum ato que consideram criminoso, mas que é aceito pelo costume local” (HOBSBAWM, op.cit., pp 37-38).

 

[1] Disponível em: http://www.inea.rj.gov.br/Portal/Agendas/GESTAODEAGUAS/InstrumentosdeGestodeRecHid/PlanodeRecursosHidricos/DoisRiosAgendaAzul/index.htm. Acesso em: 2 jan. 2023.

[2] Disponível em: https://www.cbhriodoisrios.org.br/area-atuacao.php. Acesso em: 2 jan. 2023.

 

Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.
Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.

Ver anterior

Câmara Municipal de Duas Barras cria CPI que pode afastar prefeito

Ver próximo

César Ladeira garante que será candidato a prefeito do Carmo

Comente

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Mais Populares

error: Conteúdo protegido !!