“Meus mestres inesquecíveis – 2”, por Celso Frauches

Pelo menos um leitor se manifestou para que eu continuasse contando os caminhos de aprendizagem com meus mestres da vida. Creio que representa a maioria absoluta… Continuando…

Jarbas Passarinho, Ministro da Educação de 1969 a 15 de março de 1974
Jarbas Passarinho, Ministro da Educação de 1969 a 15 de março de 1974

Entre 1971 e 1974, fui cedido pela Alerj para o Ministério da Educação (MEC), em Brasília. Lá, os meus mestres iniciais foram o secretário-geral do MEC, coronel Confúcio Pamplona, e o ministro, coronel Jarbas Passarinho. Do ministro, o respeito à democracia no ministério que dirigia, embora num governo militar, e a gestão democrática, eficiente e eficaz de um órgão público. Do coronel Pamplona, aprendi a desburocratização, a seriedade e a agilidade na tomada de decisões, a simplicidade na redação dos textos administrativos.

Após atuar na Secretária-geral do MEC, fui designado pela Junta Militar para o cargo de secretário-geral do Conselho Federal de Educação (CFE). Era presidente do referido órgão o doutor Roberto Santos, que havia saído da Reitoria da Universidade Federal da Bahia. Com ele, reforcei a minha aprendizagem no trato da coisa pública. Íntegro e exigente, lembrava meu pai nos tempos da Prefeitura de Cantagalo. O Dr. Roberto, em seguida, foi eleito governador da Bahia e, mais tarde, deputado federal.

Celso Frauches participa de reunião do CFE, em Brasília, novembro de 1973, tendo ao lado os conselheiros Edson Machado de Souza, Roberto Santo - presidente - e Pe José Vieira de Vasconcelos, vice-presidente.
Celso Frauches participa de reunião do CFE, em Brasília, novembro de 1973, tendo ao lado os conselheiros Edson Machado de Souza, Roberto Santo – presidente – e Pe José Vieira de Vasconcelos, vice-presidente.

Entre os conselheiros do CFE havia um, em particular, Abgar Renault. Com ele, eu tinha papos muito agradáveis e consegui melhorar o meu português. Abgar de Castro Araújo Renault (1901/1995), professor, educador, político, poeta e tradutor, ocupava a cadeira 12 da Academia Brasileira de Letras (ABL) e a cadeira 3 da Academia Brasileira de Filologia.

Às vezes ele sentava-se à minha mesa, pegava o parecer de qualquer colega, escolhia um parágrafo ao acaso, e começava a dar nova redação, só de brincadeira. Quando chegava ao final, havia eliminado algumas linhas. Ele tinha, realmente, o poder de síntese. Era tradutor dos poemas de William Shakespeare. Um primor. Só tinha um problema. Continuava a escrever farmácia com ph (pharmacia), Niterói como Nictheroy, e assim por diante. Dava enorme trabalho à equipe de revisão. Seus estudos e reflexões estão em um de seus livros ‒ A palavra e a ação, editado em 1952.

Outro conselheiro marcante na minha formação profissional foi Valnir Chagas (Raimundo Valnir Cavalcante Chagas ‒ 1921-2006). Participante ativo da Reforma Universitária de 68, uma lei de diretrizes e bases da educação nacional para a educação superior, e da Reforma do Ensino de 1º e 2º Graus, mais tarde educação básica. Seus pareceres doutrinários eram antológicos. Tínhamos em comum algumas coisas. Quando ele terminava um de seus pareceres doutrinários, ele me entregava o original para ser incluído na pauta de reunião do CFE e me dizia: “Esse é mais um parto que entrego aos meus pares. Agora vou partir para outro”. Ou seja, não ficava ruminando sobre os seus pareceres anteriores. Terminou um trabalho partia para outro.

Na área administrativa, tive um mestre em legislação educacional, Carlos de Souza Neves, Secretário da Câmara de Planejamento. O período que passei no CFE foi o mais enriquecedor de toda a minha trajetória profissional. Um doutorado livre em educação em todos os níveis.

Em julho de 1974, tive que retornar à Alerj, agora funcionando do Palácio Tiradentes, no centro do Rio de Janeiro, em virtude da criação do Estado do Rio de Janeiro, com a junção com o Estado da Guanabara. De 1974 a 1987, quando me aposentei como Especialista em Legislação, tive uma participação apagada, quase anônima.

Prof. José de Souza Herdy, criador da Universidade Grande Rio (Unigranrio), Duque de Caxias (RJ). Ao seu lado, Celso Frauches discursa em uma solenidade na instituição, em novembro de 1978.
Prof. José de Souza Herdy, criador da Universidade Grande Rio (Unigranrio), Duque de Caxias (RJ). Ao seu lado, Celso Frauches discursa em uma solenidade na instituição, em novembro de 1978.

De agosto de 1974 a janeiro de 1988, fui secretário-executivo da Associação Fluminense de Educação (AFE), mantenedora da Universidade Grande Rio Prof. José de Souza Herdy (Unigranrio), Duque de Caxias (RJ), em expediente compatível com minha atuação na Alerj. Ali trabalhei catorze anos, tendo como reitor o Prof. Herdy, cantagalense de Euclidelândia, descendente de imigrante suíço. A biblioteca universitária tem o nome do grande escritor nascido na então Santa Rita do Rio Negro: Euclides da Cunha. O convívio com o pastor batista e prof. José de Souza Herdy enriqueceu de modo substancial a minha experiência em gestão, agora no meio acadêmico. É um mestre inesquecível.

Tenho, todavia, um mestre que não conheci pessoalmente, senão pela leitura de seus livros: Graciliano Ramos (Graciliano Ramos de Oliveira ‒ 1892/1953), romancista, cronista, contista, jornalista, político e memorialista. Após ler Vidas Secas, li, seguidamente, toda a sua obra literária, aos dezessete anos. A experiência como prefeito de Palmeira dos Índios (AL), no agreste alagoano, levou-o a escrever dois relatórios ao então governador de Alagoas, editados pela Prefeitura de Palmeira dos Índios. Nesses dois documentos históricos encontramos o seu excepcional poder de síntese. Em frases curtas e cortantes, como lemos em toda a sua obra literária.

Celso Frauches e Angela Araújo
Celso Frauches e Angela Araújo

Entre 1988 e 2020, residi em Brasília (DF), onde atuei como consultor de planejamento, organização e avaliação da educação superior. Nessa função, os meus conhecimentos adquiridos no CFE foram importantíssimos.

Em novembro de 2020, mudei-me para a minha terra natal, Cantagalo (RJ), ondei casei com Angela Araújo de Souza e fundei o Instituto Mão de Luva, uma entidade sem fins lucrativos, com o objetivo de ser um meio de produção e difusão de vídeos, podcasts, textos, documentos e fotos sobre a história de Cantagalo. Angela, além de ser minha amada esposa é, ainda, minha mestra em língua e literatura portuguesa. Com ela, estou me reciclando nessa área, indispensável para um escrevinhador contumaz como eu.

Um alerta aos meus possíveis leitores de “Meus mestres inesquecíveis”. Os mestres foram excelentes, realmente inesquecíveis, mas o aprendiz ainda tem muito a aprender e praticar…

Cantinho da poeta Amélia Thomaz
Apreensão
Carreguei o sobrecenho,
Já não sorrio, porque
Há muitos dias não tenho
Uma carta de você…
(Extraído do livro Alaúde (Cantagalo, RJ: Ed. Autor, 1954, p. 14))

Celso Frauches é escritor, jornalista, já foi secretário Municipal em Cantagalo e é presidente do Instituto Mão de Luva.

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