Todos nós temos as mesmas 24 horas. Essa frase geralmente se apresenta em discursos motivacionais, apontando como único fator de mudança de vida a vontade própria. É aquele conselho automático diante de qualquer reclamação. Não estou satisfeita com meu corpo? Basta acordar mais cedo e correr. Meu trabalho não me satisfaz? Tenha coragem e faça o que você ama, se jogue. Empodere-se. Faça a correta gestão do seu tempo. Aprenda a administrar o seu.
Pois é, o tempo, em si, sem critérios diferentes, não é exclusivo de Maria ou Roberta. No entanto, Maria, mãe solo, com 3 filhos para criar, possui uma realidade bem diferente de Roberta, mãe de pet, que, no intervalo do seu home-office, dá um pulinho na praia para… espairecer.
Cada ser humano é uma realidade complexa e individual. Enquanto alguns, após um boa noite de sono, fazem pela manhã a sua crepioca com queijo Minas orgânico, acompanhada de uma bebida proteica, outros despertam às 5 horas para pegar o ônibus e chegar a tempo no trabalho. A primeira refeição é só no almoço. No retorno, mais algumas horas de trânsito até voltar para casa e cumprir outros afazeres, tais quais lavar a louça, estender a roupa, passar camisas, varrer a casa, preparar refeições.
Alguns reservam os fins de semana para organizar a vida. Outros, na escala 6×1, precisam correr contra o tempo para, em um único dia, organizar as tarefas básicas do cotidiano.
A inserção das mulheres no trabalho, conquistando espaço em distintas áreas profissionais, não veio acompanhada de uma divisão justa dos papéis atribuídos ao homem e à mulher no ambiente doméstico: jornada dupla, cuidado com a família, a criação dos filhos e a gestão de uma casa (no cenário mais comum, ela faz quase tudo sozinha). Ah! Sem remuneração, é claro.
Independentemente da realidade social – apesar de algumas distinções –, a sociedade ainda impõe, por pressão cultural, os afazeres de casa como encargo feminino, o que, naturalmente, leva à exaustão física e emocional. Além disso, institui-se padrão de beleza feminino, no qual é necessário investir tempo e dinheiro nos campos saúde e estética. A conta não fecha.
“As mesmas 24 horas para todos” não entende muito bem a inflação do preço dos alimentos, a maternidade, o deslocamento para o trabalho e, até mesmo, o universo psicológico individual de cada um.
Em muitos casos, não é preguiça. É exaustão. É depressão. É violência psicológica. É a ausência de estado social forte, apto a suprir necessidades básicas de um ser humano.
É claro que justificativa de falta de tempo é conveniente em outras ocasiões. Por isso, mais fácil atribuir a fatores externos aquele “não estou a fim de mudar, me deixa reclamar só um pouquinho”. Cada caso é um caso.
Seja como for, ninguém melhor do que a própria pessoa para saber como se dividem as suas 24 horas. E, antes de quaisquer deduções, use o sapato do outro para entender a rijeza do seu percurso.