“O Holofote e a Ética”, por Amanda de Moraes

Holofote

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A Constituição da República, promulgada em 1988, após o período de Ditadura Militar, prevê uma série de princípios e direitos fundamentais, que devem nortear a aplicação das leis e o bom funcionamento do Estado.

Vez ou outra, há conflitos entre direitos e princípios nela consagrados, os quais devem ser analisados, a fim de se medir sua relativização.

Na excelente obra A Publicidade Opressiva de Julgamentos Criminais (Ed. Renovar), a desembargadora Simone Schreiber analisou a colisão entre dois direitos fundamentais: a liberdade de expressão/informação e o direito a um julgamento criminal justo, ambos necessários à democracia, conforme estabelece a nossa Carta Maior.

O tema permanece atual e candente, em tempos nos quais o monopólio da televisão perdeu espaço para outros meios de comunicação, e os debates das redes sociais, principalmente envolvendo polêmicas, têm expressiva audiência.

A mídia noticia algum delito. Um fato criminoso é de interesse da sociedade, e a informação passada impacta diretamente na opinião de toda uma nação. Para refletirmos: é possível noticiar um acontecimento de forma isenta e, tão somente, informativa? O que se vê, em muitos meios, são matérias carregadas de adjetivação e subjetivismo, com conclusões precipitadas, que tendem ao clamor popular e inflam o sentimento de perturbação e indignação.

O ser humano tende, de forma natural, a expressar suas opiniões e valores em uma narrativa. Por mais que seja difícil traçar um muro entre a comunicação de um fato e a impressão pessoal de quem o divulga, é importante existir a ética em uma carreira (no jornalismo, no direito, na filosofia, na política e quaisquer outras profissões).

No Brasil, há inúmeros exemplos sobre casos criminais que desaguam em julgamento público. Antes que a investigação possa ser iniciada, elementos probatórios colhidos, depoimentos prestados e demais medidas cabíveis adotadas pelas autoridades competentes, já existe uma condenação pública, inclusive no TikTok.

O povo, desde antes do Império Romano, tem uma queda por condenações públicas – isso não é novidade. O tempo passa, e as formas de empregá-las se tornaram um pouco mais sofisticadas e apuradas.

Um dos pontos cruciais é quando toda essa densidade transpassa para o processo penal. A propósito, as autoridades não são pessoas isoladas da sociedade. Se uma pessoa é retratada maciçamente pela mídia como uma criminosa, essa ideia terá impacto na subjetividade do interlocutor (quem recebe).

Lembremos também que a Constituição Cidadã prevê igualmente a presunção de inocência a uma pessoa acusada, isto é, todo cidadão deve ser tratado como inocente até o trânsito em julgado, de uma sentença penal condenatória.

De fato, o direito à informação (liberdade informativa) e o debate de ideias (liberdade de expressão) são direitos em uma sociedade plural, justa e equânime. Defender-se em um ambiente seguro, perante um magistrado imparcial, apto a fazer uma análise coerente da situação jurídica, sem paixões e perseguições, também é.

A conclusão da mídia é diferente da conclusão de um juiz, o qual, a partir de um distanciamento do caso e da análise da reconstrução dos fatos pelas partes, ao final, decidirá (juridicamente) pela inocência ou não.

Vale lembrar, por fim, que a liberdade de expressão não é absoluta e deve-se ter cautela quando começa a adentrar terrenos de outros direitos fundamentais, como que é o caso ao direito a um julgamento justo (de qualquer outro ser humano).

 

Amanda de Moraes Estefan é advogada, no Rio de Janeiro, e sócia do escritório Mirza & Malan Advogados. Ela é neta do ex-prefeito de Trajano de Moraes, João de Moraes
Amanda de Moraes Estefan é advogada, no Rio de Janeiro, e sócia do escritório Mirza & Malan Advogados. Ela é neta do ex-prefeito de Trajano de Moraes, João de Moraes

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Um Comentário

  • PArabens Amanda de Moraes! Sempre tratando de assuntos importantes com seriedade e competência!

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