“O meu amigo Joãozinho”, por Celso Frauches

Conheci o Joãozinho (Dr. João Nicolau Guzzo) em 1947, quando me mudei para Cantagalo, com os meus pais Telva e Henrique, para cursar o ginasial. Que me perdoem suas filhas – Fernanda Léa e Míriam Lúcia -, demais parentes, colegas de profissão e seus pacientes, mas ele foi, é e sempre será para mim o amigo Joãozinho, guardado “debaixo de sete chaves, dentro do coração”, nos versos de Milton Nascimento, ao lado de outros amigos queridos.

João - foto e biografia resumida
João – foto e biografia resumida

Fizemos o “cursinho pré-admissão”, que não existe há muito tempo. Classificados no exame de Admissão, iniciamos o curso ginasial, em 1948, no antigo Ginásio Euclides da Cunha, que funcionava na rua mais conhecida como do “Pinto e Palma”, ao lado de outros amigos, como o Geraldo (Dr. Geraldo Arruda Figueredo), o Júlio (Dr. Júlio Marcos de Souza Carvalho) e tantos outros.

O Joãozinho era a alegria da turma. Alegre, comunicativo, piadista, colega das “peladas” no campo de tênis, com seus irmãos Alexandre e Wilsinho. Os óculos de “fundo de garrafa” do João prejudicavam bastante a sua atuação, assim como do Wilsinho.

Terminada a terceira série do Ginasial, em 1950, Joãozinho parou de estudar. Foi trabalhar na roça. Voltou aos estudos em 1952. Foi uma perda para a nossa turma, que ficou mais triste. Mas voltou em 1952, quando concluiu o Ginasial. Fez o curso Técnico de Contabilidade, agora no Colégio Euclides da Cunha, concluído em 1955, junto com meu pai, Henrique.

Formatura Téc. Contabilidade - 1955
Formatura Téc. Contabilidade – 1955

Em fevereiro de 1955, na posse de meu pai como prefeito de Cantagalo, eu ia me mudar para Niterói, a fim de estudar Direito. No mês anterior, o Clube Cantagalense dos Comilões, do qual eu e o Joãozinho participamos da fundação, fez um jantar de despedida, no bar do João Serra, para os que iam continuar seus estudos no Grande Rio: Geraldo, Júlio e eu. Mais beberrões do que comilões, exageramos na bebida. Eu especialmente. De improviso, Joãozinho fez um poema dedicado a mim.

Concluído o seu curso de Técnico em Contabilidade, em 1955, mudou-se para Niterói para cursar Medicina, o seu sonho. Como não tinha feito o Científico, teve que fazer cursinho pré-vestibular, em 1956. Conheci a sua saga por moradias. Todavia, quando passou no vestibular em Medicina, com muito custo, conseguiu uma Vaga na Casa do Estudante.

Gerado, Celso e João em registro de 1956
Gerado, Celso e João em registro de 1956

Enquanto estudava Medicina, na Universidade Federal Fluminense (UFF), tinha que trabalhar duro. Era datilógrafo no Cartório da 19ª Vara, em Niterói, na sobreloja do Palácio do Comércio, na Av. Amaral Peixoto. Faturava uns cruzeiros por folha tamanho ofício. Por isso era comum ele sair de madrugada. Dormia pouco, para de manhã, logo cedo, dedicar-se ao estudo da Medicina. Creio que, por uns tempos, trabalhou numa empresa de seguros, perto do cartório. O seu “chefe” no Cartório era o Geraldo, que cursava Direito. Eu? Bem, eu fui para Niterói para fazer o mesmo curso, mas o trabalho na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e a atuação em diversos jornais niteroienses, como repórter, redator ou revisor, e em um jornal falado da Rádio Mundial, como noticiarista, levou-me a iniciar um curso de Jornalista, abandonado ao final do 1º semestre letivo. A partir dessas experiências jamais pensei em cursar Direito.

Brasão da Família Nicoláo
Brasão da Família Nicoláo

Geralmente, quando eu saía da Alerj, por volta das 18h, passava no Cartório e, com Joãozinho e o Geraldo, íamos fazer um happy hour, na linguagem de hoje, num barzinho que fica nas Barcas Niterói-Rio. Dali Joãozinho voltava para o Cartório e eu para algum jornal. Geraldo às vezes ia para casa ou também voltava para o Cartório. O Júlio de vez em quando se juntava a nós, vindo do Rio.

Em um desses encontros, regados a cerveja, os quatro pensamos em criar o Grêmio dos Amigos de Cantagalo, por sugestão do Joãozinho. O GAC tornou-se realidade em 1957, com a firme atuação do dr. Lizt Sá Vieira.

Em 1963, voltei para Cantagalo, onde fiquei até 1966. Em 1963, casou-se com seu único e grande único, cantada por ele em versos e em serestas – Iolanda da Silva Monteiro. Uma das madrinhas foi minha querida prima, Martha Costa Monteiro, viúva de Júlio Monteiro, irmão de Iolanda.

Reencontrei o Joãozinho, agora como médico, em consultório no famoso sobrado dos Nicoláo e na então Casa de Caridade de Cantagalo.
Em janeiro de 1966, nasceu a sua filha Míriam Lúcia. No início de fevereiro nasceu a minha primogênita, Leilany, médica como o Joãozinho, seu pediatra em Cantagalo.

Celso Frauches
Celso Frauches

Entre 1964 e 1966, Joãozinho colaborou na administração de Henrique Frauches, especialmente, na criação do Instituto de Benefícios e Assistência dos Servidores do Município de Cantagalo (IBASMC), do qual fui o primeiro presidente. A efetiva colaboração do Joãozinho foi importante para a concretização desse projeto.

Essa não é uma biografia do Dr. João Nicolau Guzzo. É preito de gratidão ao amigo Joãozinho, uma personalidade das mais importantes para o nosso município. Quem quiser conhecer melhor esse admirável ser humano deve ler O Sobrado – Memórias e histórias de uma geração, editado em 1998, de sua autoria.

O tempo passou e nos distanciou. Fui para Brasília, onde vivi nos últimos 32 anos. Só voltei no final do ano passado. Mas o tempo não passa para nosso coração: “eu não fico triste porque sei que daqui a pouco a gente vai se encontrar”, digo como poeta mineiro Milton Nascimento. O que importa é ouvir a voz do coração.

Para fechar este artigo, transcrevo alguns versos de Joãozinho, publicado no seu livro Esparso:

Cantagalo, não ignoro
E por ti às vezes choro…
Cantagalo es tudo enfim;
Me agasalhe, eu imploro
Quando chegar o meu fim.

Celso Frauches é professor, escritor, pesquisador, ex-secretário Municipal de Cantagalo e consultor Especialista em Legislação

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