“O que tu lês é o que te tornas”, por Amanda de Moraes

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Os seres humanos possuem a capacidade de pensar. Fazem isso todos os dias. Os pensamentos sempre estiveram por aí, gerando reflexões: “O que é a vida no estado democrático? Qual é a melhor forma de organização em sociedade? Quais bens de consumo são, de fato, necessários? Somos mesmo felizes?

As observações sobre algo podem fazer com que a temática seja admirada ou questionada. E quando questionada, acarretam oposição ao estado atual das coisas. Exemplo: diante do autoritarismo, assim que cientes dos malefícios e restrições que esse sistema impõe, seres pensantes quererão uma alternativa.

Vamos um pouco mais a fundo. O livro é uma forma de eternizar uma ideia, uma maneira de pensar. Mesmo após a morte de alguns escritores e estudiosos, gerações e gerações têm acesso a um legado de reflexões. As páginas escritas permitem ao ser humano estimular o que há de mais precioso e que o distingue de outros animais: o seu pensamento.

Para alguns, isso pode parecer fantástico. No entanto, para outros, representa uma ameaça. Por quê? No romance distópico Fahrenheit 451 (1953, ed. Biblioteca Azul), de Ray Bradbury, bombeiros, em vez de apagarem incêndios, incineram livros. O enredo se desenvolve em um estado autoritário, que veda a disseminação de conhecimento e reprime qualquer ameaça à ordem imposta. A queima dos livros passa a ser uma das formas de suprimir o intelecto do ser humano. Como ocupação do tempo, as pessoas se entorpeciam com tecnologia, usada para um emburrecimento em massa. Programas banais e fones de ouvidos eram as principais companhias em mundo ilusório, criado pelo autor.

A história da humanidade já provou que esse mundo irreal não é tão fictício assim. Por exemplo, os ideais de Adolf Hitler foram marcados por uma grande perseguição a escritores. Na Alemanha, milhares de livros, considerados contrários aos padrões nazistas, foram queimados em praças públicas, como forma de purificação da literatura.

Como escreveu Ray Bradbury: “Existe mais de uma maneira de queimar um livro. E o mundo está cheio de pessoas carregando fósforos acesos.” Nos EUA, a Associação Americana de Bibliotecas divulgou nota informando que, em 2022, houve o maior número de tentativas de proibição de livros nos últimos 20 anos.

No Brasil, inúmeros livros já foram alvo de censuras, como Capitães de Areia, de Jorge Amado. O livro A semente do Nicolau, de Chico Alencar, foi retirado do conjunto didático de uma escola em Brasília. Os casos são vários, infelizmente. Mais importante do que os livros em si são as ideias que eles carregam; portas abertas ao pensamento crítico.

Interessante também é a percepção de que precisamos ler autores que pensam contrariamente às nossas concepções individuais. É pela divergência de ideias que uma nova pode surgir. Sair do nosso reduto e da zona de conforto permite conhecermos mundos novos, até para que possamos rechaçá-los com o devido embasamento. Não se busca o conhecimento apenas para validar o que entendemos ser correto. O conhecimento serve para que possamos ampliar os horizontes, desenvolver novas reflexões e conceitos.

Os livros, dizem, são formas de viajar sem sair de sua cadeira. Neste ano, quantas obras fascinaram o seu olhar, apesar de terem conteúdo do qual você discorda? Elas conseguiram modificar em você o estado atual das coisas? Que bom! Você está confiante e saudável no caminho da sabedoria.

 

Amanda de Moraes Estefan é advogada, no Rio de Janeiro, e sócia do escritório Mirza & Malan Advogados. Ela é neta do ex-prefeito de Trajano de Moraes, João de Moraes
Amanda de Moraes Estefan é advogada, no Rio de Janeiro, e sócia do escritório Mirza & Malan Advogados. Ela é neta do ex-prefeito de Trajano de Moraes, João de Moraes

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