Superthal e Caravana da Coca-Cola fazem noite mágica em Bom Jardim
Com estas palavras, inicia Clarice Lispector a sua crônica sobre a execução de um dos bandidos mais procurados na década de 1960 (Um grama de radium – Mineirinho, publicada na revista carioca Senhor): “É, suponho que é em mim, como um dos representantes do nós, que devo procurar por que está doendo a morte de um facínora. E por que é que mais me adianta contar os treze tiros que mataram Mineirinho do que os seus crimes.”
José Rosa de Miranda, vulgo Mineirinho, ficou conhecido por seus inúmeros crimes. Alvejado por treze tiros, após sua fuga do Manicômio Judiciário, não pôde retornar para cumprir a pena imposta de mais de um século.
Sem vida, ao ser encontrado na estrada Grajaú-Jacarepaguá, em seu bolso estava uma oração de Santo Antônio: “Agora, volta às tuas ocupações e não te esqueças do que te recomendei; vem sempre procurar-me, porque eu te espero.” Pois é. O que se esperava de Mineirinho e o que esperamos de nós, na humanidade?
Têmis (deusa grega da justiça) certamente ficaria exaltada, ao ver o ser humano sedento por retaliação. É mesmo verdade que existem muitos seres que se alegram com atos repudiados por eles mesmos. Lancemos uma pergunta: não matarás ou depende de quem seja a vítima?
Mineirinho morreu há bastante tempo, mas outros ainda estão por aí, marcando o compasso da reflexão sobre encarceramento, punições e segurança.
A Lázaro Barbosa, conhecido como “serial killer do DF”, foram 39 tiros, amplamente divulgados pela mídia. A sua fuga, série nacional.
Os crimes que apontam ter ele cometido são cruéis. E, para isso, a nossa legislação prevê uma série de penas e medidas. No entanto, em nenhuma delas, está a pena de morte e a sobreposição ao estado democrático de direito que a sua aplicação acarretaria. Até porque quem decidirá o momento correto e moralmente aceitável para essa subversão?
Aqui, vale também ressaltar o empenho de tantos policiais nessa ação. Todos eles deixaram suas famílias em casa e arriscaram a própria vida, por missão e propósito. Jamais se deve esquecer, e aqui repito, o desumanismo de Lázaro. Ele fez da vida o ápice do que é ser antiético, o antônimo do respeito e a afronta às leis. O tema deste texto é “qualquer vida importa, e a democracia deve ser o pilar do Estado.”
No Brasil, sobram condutas tipificadas como crimes. Somente no Código Penal, em torno de 300: crimes contra a pessoa, contra o patrimônio, contra a fé pública, contra a honra, contra a liberdade individual, etc. Isso sem esquecermos as condutas que são tipificadas em legislação especial (Código de Trânsito Brasileiro, Lei de Licitações, Lei de Drogas, etc).
Em um olhar mais atento, há grandes chances de, em algum momento na vida, nós ou algum conhecido termos passeado por essas leis. Mesmo assim, há que se reconhecer que o direito de punir acaba sendo direcionado, com mais ênfase, à determinada parcela da população, como fator, inclusive, de exclusão social.
Por fim, um exercício de consciência dificílimo, complexo. Não mensuro dores. Nunca estive na pele de alguém que perdeu um ente querido para o crime. A emoção da perda atinge a vida de muitos; perde-se aquele sabor íntegro da existência. No entanto, a vingança e a ira jamais serão termômetros adequados para a tomada de decisões. Como disse, é dificílimo, mas a ética, o Direito e a democracia precisam estar acima de quaisquer emoções.