“Os Santos”, por Dr Júlio Carvalho

Certa vez, quando eu era menino, meu saudoso e querido pai me disse que meu nome era em homenagem ao Dr. Júlio Santos, grande líder político cantagalense, cujo nome encontrava-se na placa de uma pequena rua, que começa na rua Barão de Cantagalo, atrás da Igreja Católica, terminando na praça Cônego Crescêncio Lanciotti, junto ao Fórum de Cantagalo, com cerca de 8 metros de extensão.

Desde então, pensei em melhor conhecer a história desse ilustre cantagalense, tão admirado por meu pai e tantos cantagalenses daquela geração. Recentemente, com a reclusão determinada pela Covid-19, resolvi fazer uma pesquisa utilizando um trabalho do advogado Dr. Alaôr Eduardo Scisínio, publicado pela OAB/RJ, em 1992, que o autor me enviou com fraterna dedicatória.

Dr. Júlio Santos nasceu em nosso município, em 17 de setembro de 1846, sendo filho de Manoel Vieira da Silva Santos e de Joanna Cacemira Monteiro Santos. Foi diplomado, em 1883, pela Faculdade de São Paulo, em Ciência Jurídicas e Sociais. Retorna então a Cantagalo, onde passa a advogar ao mesmo tempo que ingressa na atividade política.

Eleito vereador, ocupou a presidência da Câmara Municipal por várias vezes, a saber: 1895, 1905-1906, 1910-1917, 1923 e 1926. Outrora, o presidente da Câmara exercia a função executiva, não havendo o cargo de prefeito. Assim, no período de 1910 a 1917, o Dr. Júlio Santos inaugurou o serviço de água e esgotos em Cantagalo, e, em 1915, a energia elétrica e a iluminação pública da cidade.

No período de 1895 a 1929 (34 anos), foi eleito várias vezes deputado federal. Foi eleito senador, onde atuou de 22/04/1929 até 11/11/1930, data do fechamento do Congresso Nacional pela revolução chefiada por Getúlio Vargas.

No império, pertenceu ao Partido Liberal. Na república, foi um dos fundadores do Partido Moderador. Posteriormente ingressou no Partido Republicano Fluminense, ocupando a presidência da Comissão Executiva até 02 de junho de 1933, data em que faleceu, aos 87 anos, depois de intensa atividade jurídica, política e na imprensa cantagalense.

Como jornalista, publicou seus artigos nos jornais O Cantagalense, Voto Livre e Correio de Cantagalo, dirigido pelo Dr. Júlio Santos até 1930.

Manteve banca de direito em Cantagalo e no Rio de Janeiro de 1883 até o seu falecimento, destacando-se por sua competência e trabalhos jurídicos apresentados.

Em 1887, casou-se com Elisa Ida Sauerbronn, de cuja união matrimonial resultaram seis filhos. Fora do casamento, Dr. Júlio Santos tinha duas filhas com uma jovem criada por sua mãe, filhas que foram por ele reconhecidas e que geraram famílias de destaque em Cantagalo e em Itaocara.

A tradição oral diz que o Dr. Júlio Santos era dotado de tamanho espírito democrático que, certa vez, quando seu principal adversário político foi preso e processado, ele compareceu voluntária e graciosamente para defendê-lo como advogado, obtendo êxito na sua missão.

Dos seus filhos, o que mais se destacou foi o Dr. Júlio Veríssimo Sauerbronn Santos Filho, advogado, diplomado aos 17 anos pela Faculdade Nacional de Direito do Rio de Janeiro. Iniciando suas atividades jurídicas em Cantagalo, logo passou para o Rio de Janeiro, na época Capital Federal, onde se destacou como advogado durante 57 anos, aposentando-se aos 77 anos de idade.

No Rio de Janeiro, foi consultor jurídico do City Bank, do Bank of London e da Suerdick. Foi conselheiro do Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, no Distrito Federal.

Júlio Carvalho é médico e ex-vereador em Cantagalo.
Júlio Carvalho é médico e ex-vereador em Cantagalo.

Além de advogado, o Dr. Júlio Santos Filho (Dr. Julinho Santos, como era conhecido pelos mais íntimos), foi professor da Faculdade Nacional de Direito do Rio de Janeiro, como docente livre de Direito Comercial, defendendo a tese “O Direito Marítimo na História e na Doutrina – A sua falsa autonomia”, em 1917.

Durante 41 anos, o Dr. Júlio Santos Filho lecionou direito comercial na Faculdade Nacional de Direito; e, em 1921, lecionou como catedrático interino, direito penal, tais eram os conhecimentos jurídicos desse ilustre e culto conterrâneo. Foi aposentado por decreto do Presidente da República ao atingir 70 anos de idade.

Dr. Júlio Santos Filho publicou artigos, fez várias conferências no Rio de Janeiro e deixou alguns livros importantes como Sociedade Limitada.

O Dr. Julinho Santos, além de jurista, também foi político, sendo eleito deputado na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro em 1924, onde permaneceu até 1930, quando Vargas dissolveu o Poder Legislativo.

Como deputado estadual, foi líder da maioria durante cinco anos e líder de dois governos do antigo Estado do Rio de Janeiro, encerrando sua breve atividade política em 1930, com apoio ao deposto presidente Washington Luiz.

Dr. Júlio Santos Filho foi primoroso orador, conquistando a atenção dos ouvintes. Em Cantagalo, dois discursos se destacaram: no sepultamento do Cel. Manoel Marcelino de Paula e na inauguração do monumento comemorativo do centenário de Cantagalo.

Mas não para por aí, o Dr. Júlio Santos Filho foi poeta, caracterizando seus versos por rigorosas métrica e rima. Deixo aqui uma trova de 1962:

Prazeres e sofrimentos:
Nasce a vida e a vida passa
Deixando à mercê dos ventos,
Poesia, cinza e fumaça.

Outros filhos do patriarca Dr. Júlio Santos se destacaram, sendo o espaço insuficiente para me alongar. Farei um pequeno resumo:

  • Dr. Heitor Santos, médico otorrino laringologista no Rio de Janeiro, com trabalhos científicos publicados;
  • Dr. Álvaro Santos, advogado em Cantagalo e região, competente e conhecedor de música, sendo flautista;
  • Senhorita Elisa Santos – Cantora lírica, soprano ligeiro e musicista;
  • Sra. Hilda Santos Freire – Professora de piano, diplomada pelo Conservatório Nacional de Música do Rio de Janeiro. Mulher educadíssima, casada com o Sr. Américo Freire Junior (Sr. Mequinho). Mãe de meu amigo de infância Júlio Américo.

Belíssima e privilegiada família Santos, glória da história de Cantagalo! Infelizmente, migraram para outras terras, restando em Cantagalo apenas a lembrança e a saudade de áureos tempos!

Júlio Carvalho é médico, ex-vereador e ex-provedor do Hospital de Cantagalo, e atualmente é auditor da Unimed de Nova Friburgo.

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