“Os tempos da Prefeitura de Cantagalo – parte 2”, por Celso Frauches

Leia a parte 1 do artigo neste link.

Naqueles tempos, não havia fábricas de cimentos, royalties do petróleo e nem ISS. Cantagalo era um município cuja economia era baseada na pecuária e em uma agricultura de pouca expressão econômica A receita própria da Prefeitura era, fundamentalmente, originada dos tributos sobre imóveis urbanos e rurais e transações imobiliárias. Grande parte da receita dependia das benesses e da boa vontade dos governos do estadual e federal. Era uma forma de submeter os prefeitos ao cabresto político do governador de plantão e parlamentares hábeis na arte de conseguir verbas orçamentárias. As receitas não eram suficientes para o atendimento a todas as demandas de obras e serviços públicos de responsabilidade da Prefeitura.

A Prefeitura tinha uma receita aviltante para atender a todos os seus compromissos, como demonstrei no referido livro.

Em 2012, a moeda Cruzeiro (Cr$) deve ter se apagado da memória da imensa maioria dos brasileiros, que hoje vive os tempos do Real (R$). Para que se tenha uma noção aproximada dos ínfimos recursos financeiros administrados por Henrique, no período 1963/1966, lembro que, na cotação oficial de janeiro de 1963, Cr$ 1,00 correspondia a 460 dólares americanos. Em dezembro de 1966, ao terminar o mandato de Henrique, Cr$ 1,00 valia exatamente 2.200 dólares americanos.

Eu me dedicava em tempo integral às minhas atividades na Prefeitura, de segunda a sexta-feira. Para o prefeito, contudo, não havia nem hora e nem dia determinados para o descaso.

Em 1964, aconteceu o golpe cívico-militar, sob a liderança de setores importantes da Igreja Católica, de expressivas lideranças da UDN (União Democrática Nacional), como Carlos Lacerda e Magalhães Pinto. Mas Cantagalo acabou por ser premiada com um governador cantagalense, o general Paulo Torres, que tinha um chefe de gabinete também cantagalense, o dr. Lizt de Sá Vieira. O amor do dr. Lizt por Cantagalo e o seu dinamismo conseguiram trazer para a nossa cidade alguns empreendimentos que normalmente não teriam sido possíveis, como a Escola Estadual Maria Zulmira Torres e o Museu Euclides da Cunha.

Durante os quatro anos que passei na Prefeitura de Cantagalo pude elaborar alguns estudos que, aprovados pelo prefeito, serviram para modernizar e agilizar os processos administrativos. Desses estudos surgiram o Conselho Municipal de Turismo, Conselho Municipal de Cultura, Conselho Municipal de Contribuintes, Conselho Municipal de Desportos, o Conselho Municipal de Educação (que não chegou a ser implantado), Instituto Histórico e Geográfico de Cantagalo e o Instituto de Benefícios e Assistência aos Servidores Municipais de Cantagalo (IBASMC), além do Estatuto dos Funcionários.

Participei ativamente da criação do Pacto da Amizade para o Progresso, que tinha por objetivos ações conjuntas e a possível formação de consórcios para a solução dos problemas comuns relacionados à educação básica, ao abastecimento d’água e rede de esgotos sanitários e pluviais e às rodovias municipais. O Pacto foi fundado no dia 12 de dezembro de 1964, em Cantagalo, em solenidade realizada no Cantagalo Esporte Clube, com a participação de quinze prefeitos. O Pacto da Amizade para o Progresso era integrado pelos prefeitos dos seguintes municípios: Estado do Rio: Bom Jesus do Itabapoana, Cambuci, Campos, Cantagalo, Itaocara, Itaperuna, Miracema, Natividade do Carangola, Porciúncula, Santo Antônio de Pádua, São Fidélis, São João da Barra, São Sebastião do Alto, Sumidouro; Estado do Espírito Santo: Alegre, Apiacá, Bom Jesus do Norte, Guaçuí, Linhares, Mimoso do Sul, Muqui e São José do Calçado; Estado de Minas Gerais: Antônio Prado e Tombos.

O Pacto conseguiu poucas ações comuns. Não foi possível a formação de nenhum consórcio, tendo em vista a legislação vigente à época, em plena ditadura militar. Foi, contudo, um espaço muito útil para a troca de experiências, que pode resultar, para cada município integrante do Pacto, em ações específicas de alcance social e administrativo.

O último encontro dos prefeitos do Pacto da Amizade para o Progresso foi realizado em Santo Antônio de Pádua (RJ), em 11 de junho de 1966. A representação de Cantagalo esteve presente em todos os eventos e contribuiu significativamente para a concretização de diversas ações conjuntas, especialmente, as propostas ao governo estadual, destacando-se, a criação das Secretarias do Interior e de Planejamento, que, em ocasiões diversas, contribuíram para a realização de diversas reivindicações apresentadas.

Com a criação do Conselho Municipal de Desportos, conseguimos, com o apoio de desportistas cantagalense, tendo à frente o amigo Joel Naegele, a reativação da Liga Cantagalense de Futebol. Com isso foi possível a realização dos campeonatos municipais e regionais e a formação de atletas que foram importantes para as equipes da cidade – Cantagalo e Flamenguinho – e das vilas. A seleção cantagalense de futebol era destaque na região, reunindo, além dos craques dos dois times da cidade, os que se destacavam nas equipes de Floresta, Paraíba, Boa Sorte e Euclidelândia.

Com a construção de uma quadra polivalente, descoberta, foi possível a reorganização de equipes de basquete, vôlei e futebol de salão, hoje futsal.

A minha passagem pela Secretaria da Prefeitura de Cantagalo promoveu momentos enriquecedores para o conhecimento da realidade socioeconômica do município e da região. Trouxe, ainda, o gosto pela atividade política genuína, aprendida com as ações, o desempenho e o comportamento de Henrique à frente do Executivo Municipal.

Paralelamente às atividades na Prefeitura, colaborei com o desenvolvimento do Ginásio de Cantagalo, mantido pela Campanha Nacional de Escolas da Comunidade (CNEC). A CNEC foi uma iniciativa do educador Felipe Tiago. O setor de Cantagalo foi fundado por Henrique. Servi como secretário do ginásio e, quando foi instituída a disciplina Organização Social e Polícia Brasileira (OSPB), no curso ginasial, habilitei-me perante o Ministério da Educação (MEC) e obtive o registro para exercer a docência dessa disciplina.

As atividades no Ginásio de Cantagalo, à noite, foram enriquecedoras para mim. Ali pude conhecer melhor e fazer amizades sólidas, que podem ser representadas na pessoa do querido e saudoso amigo Ewandro do Valle Moreira. Era a “alma” do Ginásio de Cantagalo. Dinâmico, assíduo, alegre e sempre positivo em suas ações. Sem o Ewandro, o Ginásio de Cantagalo não teria sido o que foi para grande parte de jovens e adultos cantagalenses.

 

Celso Frauches
Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.

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