Jovem friburguense é campeão mundial no World Pro Jiu-Jitsu, em Abu Dhabi
Numa tarde do mês de setembro, visitei o Instituto Mão de Luva, feliz criação do meu amigo Celso Frauches, visando preservar a memória do munícipio de Cantagalo. Quando falo em amigo não me refiro a amizade recente, mas de amizade semeada há 75 anos e cultivada com muito zelo durante mais de meio século. Ela nasceu no primeiro ano do curso ginasial do extinto Colégio Euclides da Cunha.
Nossa turma era grande, quase cinquenta alunos, mas desde o início nasceu um quarteto de sólida amizade: Geraldo Arruda Figueredo, Celso da Costa Frauches, João Nicolau Guzzo e eu. Infelizmente, com a trágica morte do João, o quarteto foi reduzido a um trio que permanece unido até hoje, cujas idades somadas atingem a 256 anos de trabalhos e de lutas.
Terminada a visita às bens acabadas instalações do Instituto Mão de Luva, quando saía, recebi do Celso um ótimo presente, quatro livros de autoria de um saudoso amigo nosso, cantagalense por adoção, Sebastião de Carvalho.
Acredito que muitos cantagalenses, principalmente os mais novos, desconhecem o autor dos livros que recebi. Por isso, procurarei traçar alguns comentário sobre uma figura irrequieta e tão criativa como foi o Sebastião.
Carioca, nascido em Ipanema, em 13 de janeiro de 1936, filho do jornalista e gráfico Antônio Ferreira de Carvalho e da senhora Maria Bastos de Carvalho. Muito cedo veio para Cantagalo, onde fez seus estudos, ao mesmo tempo em que trabalhava com o pai que mantinha uma tipografia e editava o jornal Cantagalo Novo, que mais tarde recebeu o nome de O Novo Cantagalo. Seu Antônio também era músico e foi um dos componentes da Orquestra Cantagalense. Sebastião foi sempre um espírito irrequieto, gostava de estar sempre pesquisando alguma coisa, um acontecimento histórico, a vida de alguma personalidade ou a própria natureza.
Em 1965 foi diplomado, na Faculdade Nª. Sª. Medianeira, em Nova Friburgo, em Ciências Sociais. Passando a viver em Niterói, lecionou inglês e ciências sociais em vários colégios da antiga capital do estado do Rio de Janeiro.
Em 1980, através de concurso público, passou a ocupar o cargo de sociólogo do INSS em Niterói, sendo aposentado em 2006. Foi membro, também, do Cenáculo Fluminense de História e Letras (2005) e da Academia Fluminense de Letras (2017).
Outra criação do Sebastião, junto com alguns cantagalenses, em 1959, foi o Centro de Estudos e Pesquisas Euclides da Cunha (CEPEC); realizando pesquisas paleontológicas em algumas grutas de Cantagalo.
Depois de aposentado, em Nova Friburgo, passou a editar uma nova versão do Cantagallo Novo, online, que recebia com regular frequência.
Em Janeiro de 2020, ao entrar no restaurante Dª. Mariquinhas, na rua Gal. Osório em Nova Friburgo, em companhia de Letícia, encontrei com o Sebastião e a esposa Rosa Maria, sua colabora e incentivadora de trabalhos literários. Foi uma festa, só alegria, Sebastião se mostrava com ótima aparência. Infelizmente, em maio do mesmo ano, tomei conhecimento do seu falecimento.
Chegando à residência, iniciei a leitura dos livros do sociólogo Sebastião Antônio Bastos de Carvalho. Comecei pelo menor, O Tesouro de Cantagalo, 113 páginas, estilo livro de bolso, pequeno no porte mas enorme no conteúdo. Lembrei-me até de um amigo polêmico, de pequena estatura, já falecido, que no meio das discussões gostava de dizer: “lembre-se, os grandes perfumes estão em pequenos frascos”. É um profundo trabalho de pesquisa sobre Manoel Henriques, o nosso Mão de Luva, desbravador dos Sertões de Macacu. Possui vastíssima bibliografia, trabalho historiográfico que deveria ser lido por todo cantagalense.
A seguir, li A Odisseia de Mão de Luva na Região Serrana Fluminense, 151 páginas de leitura agradabilíssima para quem gosta de história; também muita pesquisa de documentos históricos, de arquivos. Tive a impressão que Mão de Luva foi explorado pelo governador de Minas Gerais e por São Martinho durante algum tempo, antes de ser preso. Não sei se estou enganado, fazendo falso juízo!
O terceiro trabalho do Sebastião que li com grande interesse foi sobre outro cantagalense, com o título: Amargura e Gênio na Vida de Euclides da Cunha. Estilo literário muito bom para ser lido concentrado em 121 páginas muito bem redigidas. Descreve a tragédia que colocou um ponto final na existência material do nosso grande Euclides da Cunha, no subúrbio carioca da Piedade, Rio de Janeiro, quando o gênio literário cantagalense tinha apenas 43 anos e ainda desejava produzir um trabalho gigantesco sobre a Amazônia, capaz de superar Os Sertões.
Finalmente, li o Álbum das Fazendas de Cantagalo, maravilhoso e cansativo trabalho realizado pelo saudoso amigo Sebastião Antônio Bastos de Carvalho e sua esposa Rosa Maria Werneck Rossi de Carvalho, que depois de visitarem 35 propriedades rurais de Cantagalo, várias com origem no Brasil imperial, elaboraram um excelente trabalho narrando vários aspecto da época dos Barões do Café, existindo ainda, em algumas, as sedes das fazenda daquela época, com móveis e máquinas para beneficiar diversos produtos agrícolas.
Infelizmente, o álbum foi impresso mais de uma década após o exaustivo trabalho do casal, alguns proprietários já faleceram, propriedades foram vendidas e muitos projetos não foram realizados. Mas, de qualquer modo, o trabalho realizado é de grande valor, a qualidade do papel usado é excelente, as fotografias de grande nitidez e conteúdo descritivo agradabilíssimo.
Acredito que as quatro obras deveriam estar em todas bibliotecas municipais para leitura dos cantagalenses como meio de consolidar nossa rica história que jamais poderá desaparecer, pois de Cantagalo nasceram treze municípios no território dos Sertões do Macacu.
Júlio Carvalho é médico, ex-vereador e ex-provedor do Hospital de Cantagalo, e atualmente é auditor da Unimed de Nova Friburgo.