“Os perigos da vida compartilhada”, por Amanda de Moraes

Cartaz da série Bebê Rena, da Netflix

Cartaz da série Bebê Rena, da Netflix

Existem pessoas que são perseguidas. As séries televisivas e nos streamings têm a capacidade de conectar as pessoas a realidades que, talvez, elas nunca tenham vivido.

Bebê Rena é uma das que eu classificaria como imperdível. Inspirada em uma história real, essa série se desenvolve com a perseguição de Martha (nome fictício) a Richard Gadd. Ele é um comediante e está enfrentando duas questões: sua sexualidade e o fracasso na carreira.

Ao tratar dos crimes de stalking (perseguição) e estupro de pessoa vulnerável, a obra propõe uma profunda reflexão sobre as consequências duradouras e nefastas que as vítimas desses atos carregam, muitas vezes, ao longo de uma vida inteira. Aliás, além do que possamos imaginar, perseguição é um delito recorrente em nossa sociedade.

O delito de perseguição, introduzido há três anos em nosso Código Penal, no Artigo 147-A, revogou o antigo Dispositivo 65 da Lei de Contravenção Penal, que previa o ato de molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou motivo reprovável.

Agora, a configuração a esse delito é mais ampla: “Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.

De maneira técnica, para haver o enquadramento da perseguição, deve existir constância e frequência, como no caso narrado na série Bebê Rena, em que Richard é afogado por ligações, e-mails e vigília obsessiva, por três anos. O meio pelo qual a perseguição é emplacada foi deixado em aberto pelo nosso legislador. Na prática, precisamos entender que a violência sofrida, além de física, gera prejuízos psíquicos. Quem já foi perseguido sente medo em ir e vir, por exemplo.

 

Cartaz da série Bebê Rena, da Netflix
Cartaz da série Bebê Rena, da Netflix

 

Na realidade brasileira, essa prática é vivenciada por muitas mulheres, que ainda são as mais atingidas. De acordo com um levantamento feito pela Folha de São Paulo, em março deste ano, a cada hora, 9 mulheres denunciam o crime de stalking no Brasil.

Criam-se contas falsas em redes sociais, e a vítima é inundada por mensagens, ligações de uma mesma pessoa, que acompanha o seu dia a dia. O perseguidor apresenta comportamento obsessivo. Apesar de ocorrer com pessoas desconhecidas, a prática é mais frequente em casos nos quais as mulheres tiveram alguma relação com os seus perseguidores.

Se há uma repetição da conduta, é preciso acender a luz vermelha. A liberdade individual da pessoa é um bem jurídico disposto tanto pela Constituição da República como pela Convenção Americana de Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário.

Interessante também é a visão que Bebê Rena, a série, traz sobre a negligência do estado frente à saúde mental da perseguidora de Richard. Empático, ele tem compaixão pela situação da mulher. Lembremos: há uma história por trás de cada ser humano.

Recomendo que você assista a essa obra, ainda mais em tempos de tantas facilidades tecnológicas que conectam seres humanos, com as mais distintas histórias de vida.

 

Amanda de Moraes Estefan é advogada, no Rio de Janeiro, e sócia do escritório Mirza & Malan Advogados. Ela é neta do ex-prefeito de Trajano de Moraes, João de Moraes
Amanda de Moraes Estefan é advogada, no Rio de Janeiro, e sócia do escritório Mirza & Malan Advogados. Ela é neta do ex-prefeito de Trajano de Moraes, João de Moraes

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