“São Martinho x Mão de Luva: herói e vilão?”, por Celso Frauches

São Martinho

São Martinho é um dos personagens mais sombrios da história de Cantagalo, desde o nascimento do povoado de Manuel Henriques, o Mão de Luva. Mas foi o único homenageado pelo Poder Público cantagalense.

São Martinho — Pedro Afonso Galvão de São Martinho —, nasceu em 24 de abril de 1741, na localidade de Portalegre, em Portugal. Foi batizado em 15 de maio de 1741, na Igreja de Nossa Senhora da Expectação, em Campo Maior, Portalegre. Era um ano mais novo do que Manuel Henriques.

Foi emigrado para o Brasil na segunda metade do século 18, diretamente para Ouro Preto, na capitania de Minas Gerais, a fim de integrar a polícia mineira no combate ao contrabando do ouro na capitania, e consagrado sargento-mor. Como militar brasileiro, desempenhou um papel significativo na história colonial do Brasil, servindo fielmente a cada governador.

Casou-se duas vezes. A primeira esposa foi Maria Agostinha da Costa Reis, filha do Dr. Manoel Manso da Costa Reis e Clara Maria Negreiros de Castro; a segunda vez com Francisca Teodora de Oliveira Maciel, filha do capitão José Alves Maciel e Juliana Francisca de Oliveira.

Deixou uma geração de filhos, incluindo: Maria Eugênia Galvão de São Martinho, que se casou com Maximiano de Oliveira Leite, e Inês de Castro Galvão de São Martinho, que se casou com o capitão Manoel Monteiro de Barros.

 

São Martinho, à frente de seu batalhão, ingressa no povoado de Mão de Luva
São Martinho, à frente de seu batalhão, ingressa no povoado de Mão de Luva

 

Pedro Afonso Galvão de São Martinho desempenhou papel importante na história da Capitania de Minas Gerais. Sua missão principal era integrar a polícia mineira, como sargento-mor, que tinha a responsabilidade de combater o contrabando de ouro, uma atividade ilegal, que era bastante comum na região devido à intensa exploração aurífera.

Em 1763, foi designado pelo governador da capitania de Minas Gerais, Luiz Diogo Lobo da Silva, que a comandou entre 1763 e 1768 para verificar, in loco, a possível existência do povoado de Mão de Luva, situado no “Certão dos índios bravios”. Atravessou o rio Paraíba do Sul, na localidade conhecida como Porto Velho (Porto Novo do Cunha) e, na região que hoje pertence ao município do Carmo, seguiu uma trilha até chegar ao local onde hoje está situado o bairro Triângulo Ferroviário. Ali parou com sua tropa, ao ouvir o canto de um galo, animal doméstico, fato que caracterizava, no meio da Mata Atlântica, a existência de pessoas. E, afinal, não seria essa a origem do nome de nossa cidade? É muito possível…

Quando ingressou no pequeno vale, de onde escorria um caudaloso riacho, encontrou Mão de Luva e seus companheiros de garimpo armados. São Martinho disse ao que vinha e os dois conversaram. Ao final, São Martinho levou uma proposta de paz ao governador. E o garimpo prosperou. Durou 26 anos.

São Martinho, por sua vez, instalou um posto militar e criou um comércio em Porto Velho, com apoio do governador, além de outras obras, a fim de abastecer o povoado de Mão de Luva do necessário para manter as famílias que ocupavam casas de pau a pique, construídas por cerca de 22 escravos, sob o comando de Manuel Henriques.

 

Mão de Luva - Criação do designer cantagalense Arthur Consídera Abreu.
Mão de Luva recebe São Martinho e passam a conversar sozinhos (Criação do designer gráfico Arthur Consídera Abreu)

 

Mas a pressão rigorosa de Luís de Vasconcellos e Souza, vice-rei do Brasil e governador da capitania do Rio de Janeiro entre 1778 e 1790, acabou por levar o governador da capitania de Minas Gerais, Luís da Cunha Meneses, entre 1784 e 1786, a determinar a prisão de Manuel Henriques e entregá-lo ao vice-rei. Somente Mão de Luva foi preso e o seu destino, nas mãos do vice-rei, é ignorado. Não há nenhum documento oficial que revele o que aconteceu a Mão de Luva nem aos seus companheiros de garimpo. Os escravos, relacionados no relatório de São Martinho, foram restituídos à capitania de Minas Gerais. Certamente São Martinho teve algum envolvimento na prisão de Mão de Luva, por sempre colaborar com as autoridades às quais estava ligado. E Mão de Luva ficou sendo, assim, o vilão da história.

Criada a cidade de Cantagalo, em 1787, São Martinho foi promovido a herói por um governo que ignorava a verdadeira história desse português naturalizado brasileiro. A rodovia que leva o nome de São Martinho é importante para Cantagalo, ligando a cidade à rodovia 116-RJ.

Os mais antigos cantagalenses conhecem a história de seo Rocha (Antônio da Rocha e Silva Júnior) e da Estrada São Martinho. Ele foi um exemplo de firme interesse pelo desenvolvimento e progresso de nossa cidade e por ter-se envolvido na luta pela construção da estrada em pauta. Ele desempenhou um papel crucial ao garantir que a estrada São Martinho iria facilitar o acesso às fábricas de cimento e seria adequada para o transporte de produtos agrícolas e para o acesso das famílias que viviam na região. Para isso, e para outras boas iniciativas, nunca recusou seu apoio, nas falas constantes e na palavra escrita.

A estrada São Martinho, além de facilitar o escoamento da produção agrícola, também ajudou a conectar diversas comunidades rurais, promovendo o desenvolvimento econômico e social da área.

E Mão de Luva, quando ganhará a homenagem que lhe devemos?

Mão de Luva, de 1991 até esta data, é ignorado pela Câmara Municipal e pela Prefeitura como fundador de Cantagalo. Mas, como sempre lembro, “a história é escrita pelos vencedores”, no caso, pela Coroa Portuguesa.

 

Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.
Celso Frauches é escritor, jornalista, historiador, pesquisador e diretor-presidente do Instituto Mão de Luva.

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