Flávia Bon Cardoso lança livro “Poesia para se Ler no Claustro” em Cantagalo
Sob o teto machista, a mulher viverá oprimida. Essa opressão compacta a alma, aniquila a espontaneidade, engessa os movimentos. Há que se falar, abertamente, das práticas culturais enraizadas em nossa sociedade, por meio de tradições, crenças, imagens, narrativas, que servem como instrumentos de desigualdade de gênero. Para exemplificar, observemos a forma como a mulher é representada no imaginário popular: a lavadeira, a materna, a esposa, a delicada, a das vestimentas “corretas”… Em suma: uma construção social.
Assim, mulheres tentam encaixar-se em papéis predefinidos, adaptando-se ao que é esperado de suas vidas. A questão é: o que a sociedade faz com as mulheres? Nesse questionamento, é preciso escolher qual caminho trilhar.
A dor faz parte da vida. Qual sofrimento escolheremos enfrentar em detrimento de outro? De um lado, o pertencimento, a adequação social. Por outro, poder expressar a autenticidade (quem você é, de fato). Sempre haverá um preço a ser pago.
O tempo passa para todos. Para as mulheres, é um pouco diferente. Concordo com a escritora Ruth Manus quando diz que “uma das mais cruéis formas de opressão é fazer com que a mulher tenha medo do próprio rosto.” Que deixe de ver suas rugas como boas lembranças de sorrisos e as enxergue como o prazo de validade que está logo a expirar. Relembra com ironia a escritora que as pessoas são generosas com as mulheres: “Ah, como envelheceu bem, dizem àquelas que não envelheceram nada.”
Mulheres são as principais vítimas de etarismo. Uma discriminação, baseada na idade, que mina por completo a autoestima, impacta na autodeterminação e gera sentimento de desvalorização e invisibilidade.
Aqui, vale lembrar a seguinte situação: aos 60 anos, uma mulher moderna, independente, solteira, pode relacionar-se com um homem de 35 anos? Bem, vamos a outro caso. Aos 60 anos, um homem moderno, independente, solteiro, pode relacionar-se com uma mulher de 35 anos? Em tese, sim, mas, na prática, os julgamentos serão distintos.
Sobre o tema, o filme A Substância, da diretora Coralie Fargeat, aborda, entre outras questões, o drama que o etarismo gera na vida das mulheres e a necessidade de adequação a padrões de beleza e procedimentos estéticos, muitas vezes brutais. Elisabeth Sparkle (Demi Moore) é uma atriz premiada, completando 50 anos, quando passa a questionar o seu valor diante do envelhecimento e, claro, da valoração imposta pelos homens. O olhar masculino diante do envelhecimento da mulher é personificado pelos grotescos executivos de uma emissora, que descartam Elisabeth Sparkle por uma mulher muito mais jovial. Não entrarei em mais detalhes, mas essa obra cinematográfica é de causar espanto. Forte, metafórica, porém real.
A questão aqui é atentarmos sobre como a violência do etarismo faz com que as próprias mulheres violentem-se, ou seja, cobrem-se, culpem-se, mutilem-se… tudo em busca da tal melhor e perfeita versão de si mesma. Sob nenhum teto, deve haver a discriminação. Para uma sociedade mais consciente, é necessário o aperfeiçoamento no quesito “a forma como a mulher é vista e exigida”.