Sejam cristãos ou não, a Sexta-feira Santa está presente. Alguns aproveitam o feriado nacional para colocar em dia aquilo que a correria dos compromissos não permite. Outros vivem com profundidade a lembrança dos últimos dias de Jesus. Seja como for, o momento impõe alguma alteração ao cotidiano, como na suspensão de atividades públicas e particulares. O motivo: um momento profundo da fé cristã, de reflexão, silêncio e oração.
Independentemente da religiosidade, precisamos, vez ou outra, desacelerar. Sustentar a angústia de não fazer nada. Um pit-stop para entendermos o que está acontecendo em nossas vidas, atropeladas pelo mundo moderno: parar para sentir, refletir sobre quem somos, para onde estamos caminhando e de que forma gastamos o precioso recurso do tempo. Reorganizar a plantação para entender que estamos, a todo momento, escolhendo sementes. Conhecer a si mesmo significa também entender o porquê fazemos o que fazemos. “Conhece-te a ti mesmo”, um dos conselhos mais marcantes em nossa cultura.
Jesus Cristo tinha um porquê. Sexta-feira Santa, dia simbólico da sua crucificação e morte, relembra a escolha por Ele assumida; vivia por uma causa, morreu por um propósito. Ao pensarmos no sacrifício de Jesus Cristo, uma pergunta se faz necessária: por quem se está se sacrificando e quem está sendo beneficiado, para não cairmos no perigoso discurso de calar-se com a promessa de uma recompensa “no céu”. Ser fiel aos ensinamentos de Cristo é relembrar a causa por Ele escolhida.
Se Jesus voltasse à vida, poderia ser tido como um militante, ou seja, aquela pessoa que luta ativamente por uma razão, enfurece-se diante das injustiças e entende que um sistema opressor pode e deve ser mudado. Estaria ao lado dos marginalizados, dos esquecidos e desprezados; partilharia o pão com os moradores de rua, conversaria com os presidiários, acolheria os doentes. Denunciaria o acúmulo indiscriminado de riqueza em detrimento dos mais pobres; pediria para o lucro ser repartido. No evangelho de João, 8:1-11, Jesus se coloca entre os homens que queriam apedrejar a mulher adúltera: “Quem não tiver pecado atire a primeira pedra”, disse ao expor a hipocrisia da sociedade, que precisa apontar um transgressor para se diferenciar dele. “Aquele é o errôneo, mas eu não.”
Quando nascemos, diversos fatores escolhem por nós a religião que seguiremos, a espiritualidade que praticaremos, já que não temos muita opção nesse sentido. No entanto, ao longo da vida, adquirimos o poder de escolha, de questionamento, de discernimento. Jesus Cristo é claro ao escolher um lado em um mundo desigual. Ser cristão é colocar em prática a lei maior de amor ao próximo. E, na Sexta-Feira da Paixão, ainda mais. Com isso, o pleno respeito e admiração a quem, independentemente de gênero ou crença, exerce uma vida em harmonia à virtude da compaixão. Seguir Cristo é uma decisão pessoal, com um enorme responsabilidade: praticar os ensinamentos do Mestre, em atos, pensamentos e palavras.