“Viajando no tempo – 4”, por Celso Frauches

A minha viagem no tempo continua.

Estou em 1922, num país ao Sul das Américas, conhecido por Jabuticabalândia. Pasárgada, onde o rei é meu amigo, é uma província independente. Graças ao invento da Nasa local, a máquina do tempo, viajo até Cantagalo, minha terra natal, na região serrana fluminense, nesta segunda década do século 20.

Celso Frauches
Celso Frauches

Após o descanso, no dia 27 deste mês de outubro, retomei ao meu rolê pela cidade e distritos.

A grafia das palavras, em diversas oportunidades, respeita a reforma da língua portuguesa, vigente em 1922.

Hoje, vou ao distrito onde nasci, São Sebastião do Parahyba, na grafia da época, ao Norte do Município.
Banhado pelo caudaloso Rio Parahyba do Sul, com uma grande área, onde são produzidos café e cereais. O café e as extensas plantações de arroz, à margem do rio, são o forte de sua economia, ao lado de uma incipiente agropecuária. O arroz Anã, cultivado há décadas, é produzido pela agricultura familiar, em Porto Marinho (4º distrito de Cantagalo-RJ), um povoado que tem uma bela Igreja Católica, onde o meu primo Douglas Frauches foi batizado. O arroz tem, segundo os fazendeiros que o produzem, consistência e sabor únicos. É a base da culinária local.

Na Vila, a atração principal é a imponente Igreja, construída em um plano elevado. Há uma escola pública. Tenho um bate papo com Isaltino Cosandey e Orlando Periard, destacados comerciantes locais, que conheci realmente por volta de 1945. No tempo do governo Portella, S.S. do Parahyba foi município autônomo, elevado à Villa pelo Decreto nº 218, de 7 de outubro de 1890.

Volto à cidade de Cantagalo, ainda em 1922, a tempo de assistir a mais um filme no Cine-Theatro Elias: The Kid, uma comédia dramática dirigida e estrelada por Charles Chaplin, o grande astro da década de 20.

No dia seguinte, vou à vila de Santa Rita do Rio Negro, 5º districto, hoje Euclidelândia. Foi elevado à categoria de freguesia pelo Decreto nº 272, de 9 de maio de 1802. Alcança as terras do hoje distrito de Boa Sorte, inexistente à época, sendo atravessado pelo Rio Negro. É grande exportador de laticínios. Aqui houve muito ouro, extraído pelo fundador de Cantagalo, Manoel Henriques, o Mão de Luva. É servido por uma escola pública. Nesse ano, a Igreja Católica está em ruínas, embora tenham providenciado um fundo importante para a sua reconstrução. É o mais antigo povoado do Município, depois da cidade. Aproveito para visitar, na parte da tarde, a Fazendo São Clemente, de propriedade do Cel. João Henrique Monnerat, administrada por José Gil Monnerat. É dotada de uma excelente residência, terras férteis, vastas e magníficas lavouras. Dista nove quilômetros da estação de Ferro de Cantagalo. É uma propriedade com 613 alqueires entre matas, capoeiras, pasto e lavouras. Produz três mil arrobas de café por ano. É banhada pelo Rio Arêas, com três quedas d’água. Fica numa altitude de 430m sobre o nível do mar. Limita-se com as fazendas Arêas, Santa Bárbara, Santa Thereza, São José, Jacutinga e Santa Maria. É abastecida por energia elétrica. Possui engenhos de café e serra vertical e bom rebanho de gado zebu. Aqui residente 32 famílias de colonos de várias nacionalidades e uma imponente sede.

Grupo de fazendeiros dos mais adiantados do munícipio de "Cantagallo", vendo-se, da esquerda para a direita, os srs: Manoel Cândido Nunes, Dr. Augusto de Faro Carvalho, Dr. Teixeira Leita, Cel. Alberto Augusto Thomaz e Manoel Borges.
Grupo de fazendeiros dos mais adiantados do munícipio de “Cantagallo”, vendo-se, da esquerda para a direita, os srs: Manoel Cândido Nunes, Dr. Augusto de Faro Carvalho, Dr. Teixeira Leita, Cel. Alberto Augusto Thomaz e Manoel Borges.

Depois de pegar bastante sol na Fazenda São Clemente, cheguei à cidade com dor de cabeça. Recorri à Pharmacia Reis, de propriedade de Torres Lima, autor, fabricante do afamado “Desopilante Torres Lima”, de grande aceitação no mercado. Comprei Melhoral, “que melhora e não faz mal”. Tomei e a dor foi embora…

Então voltei ao 5º districto Santa Rita do Rio Negro para visitar a Fazenda de Arêas, cuja proprietária é a Baroneza de São Clemente. Sou recebido pelo atual administrador, Mario de São Clemente, que me afirma entusiasticamente: “O senhor está numa fazenda que, não só Cantagallo, não apenas o Estado do Rio de Janeiro, mas o próprio Brasil deve orgulhar-se desse monumento, que é a Fazenda de Arêas, bem pouco conhecida, aliás, em relação à sua importância”. Entusiasmado com essas palavras, percorri a fazenda com o seu gerente. Pude constatar uma pujante produção nos seus 947 “alqueires de 75 x 75”: matas virgens, capoeirões, capoeiras, lavouras de café, cana, milho, arroz e ótimas pastagens de capim gordura e angola. Mais de cem alqueires em “belos vergedos”.

Fazenda de São Clemente – 1922

Encontrei mais de quinhentos mil pés de café plantados, a maior parte plantada de 1915 para cá. Nos anos imediatamente anteriores, a produção alcançou 135 toneladas de café, 300 de milho, 60 de feijão e 50 de arroz. Promove a “creação de bovinos: mestiços zebú e caracu e de puro sangue zebú Guzerat, inclusive toiros indianos importados”. Os trabalhadores são de origem portuguesa, espanhola e italiana, “sendo o systema de contracto a meiação no café e na canna, pertencendo os cereais aos colonos”. É servida por uma “hydro-electrica, pelo systema Francis, com 50 H.P. de força”. A fazenda é profusamente iluminada, “tantos nos interiores de todas as múltiplas dependências como externamente”. Saio da Fazendo Arêas encantado com a sua importância para a economia de Cantagalo e região. Despeço-me do administrador, Mario de São Clemente, cumprimentando-o pelo excelente trabalho.

De volta à cidade, percorro, absorto, as suas vias públicas, como as ruas Benjamim Constant, Euclydes da Cunha, Mão de Luva e as praças Marechal Deodoro, Quinze de Novembro e Dr. Miguel de Carvalho. Conheço o Collegio Nossa Senhora das Dôres e a Fabrica de Chapeos da Família Zanon.

Assim termino a minha viagem. Aciono a máquina do tempo e volto Cantagalo, no dia 18 de outubro de 2021, a tempo de escrever este último artigo sobre o nosso município em outubro de 1922.

Leia os relatos anteriores desta viagem:

Artigo – Viajando no Tempo 1

Artigo – Viajando no Tempo 2

Artigo – Viajando no Tempo 3

NOTA

Serviu de base para esta viagem no tempo o Album do Municipio de Cantagallo, organizado e publicado em 1922, sob a direção do Dr. Julio Pompeu.

Celso Frauches é escritor, jornalista, já foi secretário Municipal em Cantagalo e é presidente do Instituto Mão de Luva.

Ver anterior

Escolas municipais e creche municipal em Cantagalo recebem sanitização

Ver próximo

Como cuidar do corpo antes da chegada do verão

Comente

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Mais Populares

error: Conteúdo protegido !!