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Em meio à acalorada discussão no Congresso Nacional, a (des)criminalização do aborto, com ênfase em casos de estupro, voltou ao centro de muitos debates.
Em termos simples, descriminalizar significa que determinada conduta deixa de ser crime. Portanto, não poderá haver a punição no âmbito penal, ainda que em outras esferas tenha-se algum tipo de sanção, como nos ilícitos civil e administrativo.
O direito penal, diante do seu rigor e das consequências graves que acarreta para a vida das pessoas, pode ser entendido como ultima ratio, isto é, norteado pelo princípio da intervenção mínima. Nas palavras do professor Cezar Roberto Bittencourt: “Se outras formas de sanções ou outros meios de controle social revelarem-se suficientes para a tutela desse bem, a sua criminalização será inadequada e desnecessária.”
Apesar disso, no Brasil, existe a ideia de expansão da legislação penal como solução para os conflitos da sociedade. É como se todas as respostas para as crises vivenciadas pela sociedade encontrassem amparo no recrudescimento do direito penal. Tudo passa a ser crime…
Os artigos 124 a 126 do Código Penal delimitam a prática de aborto. As exceções encontram-se no artigo 128, incisos I e II, ao preverem que não se pune o aborto praticado por médico, quando for necessário para salvar a vida da grávida ou quando a gestação é fruto de um estupro. Além disso, o Supremo Tribunal Federal, em 2012, decidiu que a interrupção da gravidez de feto anencéfalo também não pode ser punida.
Quando do início do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, em setembro de 2023, a Ministra Rosa Weber, ao votar pela descriminalização da interrupção voluntária da gravidez (aborto), nas primeiras 12 semanas de gestação, ponderou que o tema, por suscitar questões de ordem moral, ética, religiosa e jurídica, é de extrema delicadeza.
Em aula magna na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), o Ministro Barroso explicou que “ser contra o aborto e tentar evitá-lo não significa que se queira prender a mulher que passe por esse infortúnio — porque é isso que a criminalização faz e impede que as mulheres pobres usem o sistema público de saúde e, portanto, se mutilem e passem por imensas dificuldades.” Conforme pontuado pelo Ministro, cabem também ao Estado a educação sexual e o apoio necessário a mulheres que queiram ter filhos.
A situação é ainda mais delicada quando se está diante da gravidez oriunda de estupro, mormente quando ocorre com crianças e adolescentes.
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou, em 2023, uma estimativa alarmante: 822 mil casos de estupro por ano, no Brasil, o equivalente a dois por minuto. Detalhe: uma significativa quantidade de mulheres engravida após essa violência.
Muitas meninas, que geralmente são violentadas por pessoas próximas ao seu convívio, como pai, tio e primos, não conseguem, por inúmeras questões, identificar que estão grávidas no início da gestação. Aliás, muitas desconhecem o que é gravidez. Qual amparo pretendemos dar a essas mulheres e meninas? Criminalizar a conduta da vítima?
Ser contra a criminalização do aborto não significa ser favorável à sua prática. Retirar o debate da área penal e o conduzi-lo para o ceio da saúde pública, com o acolhimento necessário a mulheres, sejam vítimas de estupro ou não, não significa apoiar abortos, mas compreender que o cárcere, a estigmatização e todas as demais consequências oriundas do direito penal não são a resposta efetiva a uma situação que, por si só, já é causa de enorme sofrimento à mulher. Repito: ser contra a criminalização do aborto não significa ser favorável à sua prática?