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Por volta de 1760, o garimpeiro Manuel Henriques – cognominado Mão de Luva por usar uma luva preta na mão direita – saiu de Guarapiranga, nas Minas Gerais, para prospectar ouro em uma região totalmente fechada pela Coroa Portuguesa. D. José I (1714/1777), o Reformador, terceiro filho do rei D. João V e sua esposa a rainha Maria Ana da Áustria, era o rei de Portugal e Algarves.
Manuel Henriques era um líder nato. Na região aurífera de Ouro Branco (MG), sua terra natal, as riquezas auríferas estavam mais difíceis de garimpar e os oficiais do governo provincial já o perseguiam, por não recolher o tributo da época, o “quinto”, que correspondia a 20% do valor da produção.
A “região fechada” não tinha uma divisão política definida pela Coroa entre as capitanias Hereditárias do Rio de Janeiro e Minas. Manuel Henriques deve ter pensado: “é pra lá que eu vou”!… E veio.
Saiu de Guarapiranga com seus três irmãos – Antônio, Félix e Ignácio -, outros garimpeiros de sua equipe, mais escravos e libertos. Atravessou os rios Pomba e Paraíba do Sul, este, no local conhecido como Porto do Cunha. Veio fazendo picadas a partir das terras hoje conhecidas como Carmo, onde está o distrito de Santa Rita da Floresta, prosseguindo com suas trilhas até chegar a um local onde havia uma restrita entrada para o vale, totalmente cercada por morros e dois córregos abundantes. Pensou, como qualquer líder e empreendedor: “aqui é o local ideal pra criar uma roça”. Tem farta madeira de lei, água e arbustos vários para o teto. Entraram com as picadas por esse pequeno espaço, mas logo vislumbraram um vale próprio para o seu esconderijo, longe dos curiosos olhos dos que poderiam trilhar pela região. Estavam armados, a fim de se defenderem e resguardarem o ouro porventura garimpado, uma espécie de moeda da época.
Em 1763, o governador da Província do Rio de Janeiro instaura a “Devassa Geral do Extravio de Ouro nas Novas Minas de Cantagallo”. Reconhece a extensa região, três anos após a chegada de Manuel Henriques, como “Novas Minas de Cantagallo”. Essa devassa foi somente cumprida a partir de 1784, 21 anos depois. Um “bandido” seria preso imediatamente. Mas não era um “cangaceiro”. Era tão somente um garimpeiro no seu trabalho habitual. Bandido talvez fosse o governador da Província de Minas Gerais e Goiás.
O sargento-mor Manoel Vieyra Leão elaborou um mapa dessa região, pouco depois do estabelecimento de Manuel Henriques, como de “Sertões dos Índios Bravos”, habitada por vários nativos, principalmente pelos Puri. Nesse espaço, Mão de Luva construiu o seu “império”, que esteve sob sua liderança e governo de 1760 a 1786. 24 anos garimpando ouro sob a proteção do governador da província mineira – Luiz de Vasconcelos Menezes -, porque, em 1784, pressionado fortemente pelo Vice-rei Luiz de Vasconcelos e Souza, enviou a Manuel Henriques uma “carta de engano”, usada naqueles tempos para ofertar uma trégua, aos que atuavam fora das leis da Coroa Portuguesa. Esse “engano” levou os garimpeiros das Novas Minas de Cantagalo a relaxarem e aguardarem a visita do sargento São Martinho e seus soldados. Quando estes vieram, Mão de Luva e seus companheiros foram presos – “Córrego do Canta Gallo do descoberto do Macacu”, segundo São Martinho em seu relatório final – e levados à presença do Vice-rei fluminense. Manuel Henriques, seus irmãos e colegas de garimpo foram processados e degredados a rincões não definidos nos atos oficiais, entre África e a região Sul do Brasil.
O povoado construído por Mão de Luva e seu grupo de garimpeiros foi completamente destruído pelos soldados de São Martinho. Para esse local, já definido como Novas Minas de Cantagalo, imediatamente o governador da Província do Rio de Janeiro enviou Manoel Pinto da Cunha e Souza, acompanhado de militares, um pároco e agentes públicos. Ali ele edifica a casa de Registro de Ouro e algumas construções administrativas. Inicia-se a distribuição das “datas” ou sesmarias nas Novas Minas de Cantagalo.
O termo “sesmaria” era empregado aos terrenos que pertenciam à Coroa Portuguesa sem atividades econômicas ou ocupação do espaço colonial.
O edital exigia que os sesmeiros construíssem no local da roça de Manuel Henriques uma Igreja Católica. E assim foi realizado. Feita de pau-a-pique, mais tarde deu lugar à construção da futura Igreja, inicialmente dedicada a São Pedro. Essa obra durou cerca de cinquenta anos, reconhecida, à frente, como do Santuário do Santíssimo Sacramento.
Os sesmeiros, contudo, não encontraram a quantidade de ouro esperada. Quando Mão de Luva foi preso, a riqueza aurífera já não era abundante. Em pouco tempo esgotou-se. Lembre-se que a região prospectada por Manuel Henriques corresponde a extensa região serrana fluminense, com exceção de Guapimirim, Petrópolis e Teresópolis.
O povoado foi crescendo.
A região, conhecida inicialmente como “sertões dos índios bravos”, entre 1770 e 1814, aparece logo em seguida como Sertões das Cachoeiras de Macacu ou de Cantagalo, Novas Minas dos Sertões de Macacu, Novas Minas de Cantagalo, São Pedro de Cantagalo e Cantagalo.
Em 1806, veio a criação do Distrito de Novas Minas de Cantagallo, pelo alvará de 9 de outubro de 1806, integrado ao Município de Santo Antônio de Sá, na Província do Rio de Janeiro e o reconhecimento como Freguesia do Santíssimo Sacramento. Em 1814, o distrito foi elevado à categoria de município, sob o nome de vila São Pedro de Cantagalo; em 1857, a vila foi elevada à categoria de cidade de Cantagalo. O século XVIII e as primeiras décadas do século XIX, marcaram o período áureo de Cantagalo, considerado “Celeiro da Terra Fluminense”.
Em 2023, comemoramos os 209 anos da criação, em 9 de março de 1814, do município de Cantagalo: 263 anos de fundação do povoado; 217 anos do distrito de Novas Minas de Cantagalo; e 166 anos da elevação de vila à categoria de Cidade. Há muito a se comemorar!
Salve, Salve Cantagalo
Terra de beleza e encantos mil
Com seu povo nobre e hospitaleiro
Terra da morena gentil…
(Marcha de Cantagalo, letra de Júpiter Nicolau (Juju) e música de Pastel)