Colégio Conde de Nova Friburgo, em Euclidelândia, conquista vários prêmios
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A condenação e degredo de Manuel Henriques é também controversa. Na versão de Acácio Ferreira Dias, ele é deportado para a África. No navio, ele entrega uma carta ao comandante, destinada à rainha D. Maria I, na qual declara seu amor eterno. Após ler a carta, a rainha fica tomada por risos estridentes, o que lhe rende a alcunha de “Maria I, A Louca”.
Rodrigo cita John Mawe – Viagens ao interior do Brasil¹. Nesse livro, sem mencionar a fonte, Mawe informa que os homens do Descoberto foram presos, sentenciados e posteriormente enviados à África ou condenados à prisão perpétua, possível fonte de Acácio. O livro de Mawe teve a 1ª edição em 1812, 26 anos após a prisão de Mão de Luva.
J.J. Von Tschudi, no livro Viagens às Províncias do Rio de Janeiro e São Paulo², baseado em uma carta datada de 1786 – escrita pelo vice-rei e encaminhada ao Brigadeiro Xavier da Veiga Cabral da Câmara (governador do Rio Grande do Sul), defende que o Luva teria sido deportado para o Rio Grande do Sul, onde falecera por volta dos 85 anos de idade, entre 1824 e 1825.
Rodrigo, em sua dissertação de mestrado, argumenta que, sem os processos em questão esclarecerem este ponto: “[…] considerar-se-ão todas as hipóteses apresentadas acima, pois as duas primeiras são oriundas de relatos orais, e a última, fruto de uma pesquisa arquivística. Assim, tomamos a posição de apresentar as premissas de cada um e deixar em aberto a dita questão”. Parece, todavia, que a versão de Tschudi é a mais provável, por se basear em “pesquisa arquivística”.
O desconhecido na história de Manuel Henriques
A lenda e a realidade não esclarecem algumas questões, ainda em aberto.
A origem da luva preta na mão direita de Manuel Henriques, que deu origem à alcunha “Mão de Luva”, não é documentada em A odisseia de Mão de Luva na região serrana fluminense, de Carvalho, nem na dissertação de mestrado de Oliveira. Não há documento que ateste a sua origem e uso. O degredo de Manuel Henriques, na lenda, é para a África; na versão de Carvalho pode ter sido para a África ou Rio Grande do Sul. Em Oliveira, a versão aceita é o degredo para o Sul, onde veio a falecer, com outro nome. Fato comum à época. Não há referência ao novo nome e nem a data de chegada e permanência no Sul.
Outras questões permanecem em aberto: a data de nascimento e a idade de Manuel Henriques quando veio para os “Sertões de Macacu”; o destino de Manuel Henriques e seus irmãos, incluindo a possibilidade de terem adotado novos nomes durante o período de degredo; o que aconteceu com a esposa de Manuel Henriques, que mais tarde se tornou viúva, e seus filhos. Essas informações não são mencionadas nas pesquisas de Sebastião Carvalho, Rodrigo Oliveira ou em qualquer outra investigação, ou livro disponível até o momento.
A origem da denominação de Cantagalo só é mencionada na versão da lenda. De acordo com ela, o nome teria surgido do canto de um galo, indicando a existência de um povoado entre as montanhas da futura cidade, um povoado, que seria o do garimpeiro Manuel Henriques. Essa versão não tem base documental nas versões de Carvalho e Oliveira.
Jean Baptiste Debret, em Viagem pitoresca e Histórica ao Brasil (São Paulo: Martins, 1940), editado originalmente na França, em 1835, no capítulo “Colônia suíça de Canta-Gallo”, fala da localização, “no distrito de Canta-Gallo, dependente da província do Rio de Janeiro”, da primeira colônia suíça instalada no Brasil, durante o reinado de João VI, a Colônia Nova Friburgo, a partir de 1819.
A lenda pode ter sido construída com base na tradição oral. O canto do galo parece, realmente, indicar a origem do nosso topônimo: Cantagalo. Não há outra explicação plausível. Talvez o canto de um galo na primeira inspeção de São Martinho, entre 1763, seja realmente a origem. Mas seguramente não foi o canto de um galo de São Martinho para, em 1786, invadir o povoado. Esse povoado já era conhecido desde 1763 e teve mapa publicado em 1767 – “Certão ocupado por Índios Bravios”.
¹ Belo Horizonte: Itatiaia, 1978, p. 97.
² São Paulo: Martins, 1953, p. 83.